tag:blogger.com,1999:blog-34967233810624825622024-03-19T00:10:13.181-03:00COTIDIANO EM MOVIMENTOMicrocontos inspirados em episódios aparentemente banais que marcam a vida de pessoas comuns.
Reflexões confessionais sobre o cotidiano.GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.comBlogger99125tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-81376835092647868242020-08-10T18:46:00.007-03:002020-08-10T19:18:51.754-03:00<br />
<div style="text-align: center;"><b>PISTOLA DA PAIXÃO</b></div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">
A famosa casa Christie's leiloou por 434 mil euros uma pistola Lefaucheux, calibre 7 milímetros, fabricada no século XIX. É uma arma com capacidade de seis tiros, muito comum à época, cujo modelo pode ser comprado por preço irrisório em muitos antiquários europeus. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Por que o valor astronômico? Simplesmente porque foi a arma utilizada por Paul Verlaine para atentar contra a vida de seu amante, Arthur Rimbaud, em um hotel de Bruxelas, numa tarde de 1873.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Os dois ícones da literatura francesa tiveram um tórrido affaire, alimentado de paixão, ódio, álcool, choro e violência. Enfim, uma relação sulfurosa que quase custou a vida de Rimbaud, então com 18 anos de idade. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Verlaine, onze anos mais velho, decidiu voltar para sua esposa, Mathilde, com quem casara em 1870. Decidido a recomeçar a vida, deixa Londres e viaja para Bruxelas. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Inútil. O amante vai ao seu encontro. No hotel as discussões recomeçam cada vez mais violentas e insensatas. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Os ânimos se acirraram, Verlaine saca a pistola e grita: "<i>tiens! je t'apprendrai à vouloir partir</i>" (toma, vou te ensinar a querer ir embora!). São apenas dois disparos. O primeiro atinge o punho de Rimbaud; o segundo, a parede do quarto.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Ferido, Rimbaud é atendido num hospital. A ferida é superficial. O medico aplica-lhe um curativo e o libera. Temendo por sua vida ele se apressa a deixar Bruxelas. Já na rua, Verlaine o aborda e ameaça tirar-lhe a vida. A polícia chega. Ambos são levados ao comissariado de polícia para prestar esclarecimentos. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Verlaine termina condenado a 2 anos de prisão anos por homossexualismo. No cárcere ele se dedica a escrever poemas, dispersos nos livros <i>Romances sans paroles</i> (1874) e <i>Sagesse</i> (1881). </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Rimbaud volta para a casa da mãe onde procura superar o trágico rompimento, escrevendo o livro <i>Une saison en enfer</i>. </div><div style="text-align: justify;"><br /></div><div style="text-align: justify;">Assim termina o romance que provocava furor nos salões literários da época e escandalizava a sociedade conservadora.</div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-78132968830834734302020-08-06T09:00:00.001-03:002020-08-06T09:00:01.931-03:00<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<b><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">O BEIJO<o:p></o:p></span></b></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Aos
onze anos beijar na boca era sua aspiração mais alta. O desafio supremo, quase
inatingível para o menino retraído, atormentado por uma incurável timidez.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Um
dia aconteceu. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Acompanhava
em silêncio a coleguinha da escola até a casa. Dividiram o lanche que sobrara
do recreio e saíram de mãos dadas pelas ruas do bairro, que começavam a
escurecer naquele fim de tarde de inverno. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">A
brisa fria insinuava desejos etéreos, diáfanos. Foi tudo muito rápido. De supetão, ela o espreme contra um muro, beija-o docemente e desaparece na esquina, saltitante. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Entorpecido
pela magia daquele instante mágico, o menino não compreendeu que o beijo
roubado lhe abrira o portal para um mundo desconhecido. Tomou-se de
surpreendente audácia, sentiu uma volúpia inexplicável e a certeza de que nada
seria como antes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Adulto,
não aprendeu a amar. Sua vida foi uma sucessão de fracassos sentimentais, de
prazeres efêmeros, de solidão profunda.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Aquele beijo fugaz o resgatara da introspeção,
mas também acendera o fogo das paixões efêmeras cujas labaredas consumiriam vorazmente
suas entranhas, para depois jogá-lo no abismo da eterna solidão. </span></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-55930284013093238592020-08-06T06:10:00.003-03:002020-08-06T06:16:10.420-03:00Babá<br />
Minha babá se foi duas vezes.<br />
A primeira quando deixei de ser bebê.<br />
Não nos vimos por décadas.<br />
Um dia reapareceu para me pedir<br />
o patrocínio de uma causa jurídica,<br />
que não tive como assumir.<div>Saiu sem deixar endereço.</div><div>Decepcionada.<br />
Agora partiu para sempre.<br />
Despediu-se da vida,<br />
deixando-me uma dor pungente<br />
por não ter retribuído<br />
o amor que recebi de suas mãos<br />
ternas e maternais.<br />
<br />
<br /></div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-76775891853324344482020-08-04T17:30:00.000-03:002020-08-04T17:30:24.556-03:00<br />
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: center;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">FETICHE</span></b><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Aquele
cliente sempre intrigara a vendedora de lingeries. Ainda jovem, impecavelmente
vestido, ocupava um elevado cargo na magistratura. O porte imponente inspirava
respeito, decência. <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>A voz suave,
aliciante. Mas tinha um <i>modus operandi</i> particular: todas as semanas ia à loja e
pedia três peças íntimas do mesmo modelo e cor. Naquele
dia não foi diferente:<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
Três calcinhas vermelhas, bem provocantes.<span style="mso-spacerun: yes;">
</span><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><span style="mso-spacerun: yes;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">A
vendedora não conteve a curiosidade:<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
Por que o senhor não escolhe cores diferentes? Sua esposa vai adorar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Ele
piscou o olho e disse em voz baixa:<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
Na verdade ela ama os presentes, diz que tenho bom gosto e veste as peças em
ocasiões bem especiais, se é que me entende.<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
Mas também tenho duas amantes – disse com uma voz grave, recostando-se no
balcão. – Uma não tem conhecimento da outra. Esse clima de mistério, a
atmosfera de clandestinidade, o medo de ser descoberto, tudo me excita. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Percebendo
o embaraço da moça, continuou: <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
Você não pode imaginar o prazer que sinto quando elas vestem as lingeries e se sentem únicas
em meus braços...<o:p></o:p></span></div>
<br />GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-49885817640607149642020-07-18T18:23:00.000-03:002020-07-18T18:27:57.082-03:00<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center;">
</div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">COLO
DE MÃE<o:p></o:p></span></b></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Quando frequentava os prostíbulos, ainda
adolescente, só tinha uma exigência: transar com as putas mais velhas,
ignoradas pelos clientes, invisíveis à lascívia dos homens ávidos por carne
fresca.<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Alvo de chacota dos amigos, justificava a
escolha:<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">– Elas são as melhores. Conhecem como
ninguém as astúcias do sexo. São experientes, carinhosas e não têm pressa em
acabar o serviço. Ainda por cima o cachê é o mais barato da casa.<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Ao longo dos anos manteve-se fiel às
mesmas convicções. A enorme diferença de idade foi a marca de todos os seus
amores. Apenas assim sentia-se seguro, confiante.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Ao final da vida compreendeu que suas conquistas
amorosas não passaram de desvairada busca pelo colo de
mãe que lhe fora negado em sua infância infeliz e solitária. <o:p></o:p></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-67454581246155916742020-07-17T15:05:00.001-03:002020-08-06T06:04:20.612-03:00<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center;">
<b><span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;"><br /></span></b></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center;">
<b><span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;"><br /></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<b><span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;">INFARTO<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;">O corpo do velho moralista jazia nu na
cama daquele quarto sufocante, na pensão fétida de rodoviária, frequentada por malandros, prostitutas e desiludidos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;">O filho é chamado para as providências de praxe. Observa as paredes sujas, a toalha encardida, as roupas pelo chão. Presa a um fio improvisado, a luz vermelha </span><span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt; text-indent: 17pt;">balançava preguiçosamente, insinuando uma atmosfera lúgubre, decadente.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;">A esposa não poderia ser informada das
circunstâncias em que o marido fora encontrado. Não suportaria o escândalo.
Morreria de desgosto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;">Envolvida no lençol encardido, a moça
pálida e esquelética soluçava:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt; text-indent: 17pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17pt;">
<span face="" style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt; text-indent: 17pt;">– Não tive culpa, moço. Seu pai morreu dum
gosto.</span></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-5904385552426432942020-07-16T20:53:00.002-03:002020-07-17T12:00:25.172-03:00<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<b><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">RECOMEÇO<o:p></o:p></span></b></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<b><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Mal começara a vida em comum, o marido
tratou de convencê-la de que era incapaz de seguir a profissão com que tanto
sonhara: professora de belas artes na universidade local. Afirmava ser ela
desprovida de vocação e de formação científica para conduzir as disciplinas e
participar dos acirrados debates acadêmicos. Deveria evitar o vexame, a vergonha de expor sua inferioridade intelectual.</span><br />
<span style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt; text-indent: 17pt;"><br /></span>
<span style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt; text-indent: 17pt;"> Só queria protegê-la de futuras frustrações.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Fingiu acreditar na perversa falácia.
Conformou-se em fundar uma família aparentemente feliz com o homem que amava. Mas não conseguiu
escapar ao sentimento de frustração por ter desistido tão facilmente dos seus
sonhos. Procurava esconder o amargor da derrota sem combate, esmerando-se na criação
dos filhos e na condução do lar. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">O marido reclamava constantemente de problemas
financeiros. Recusava ir a restaurantes em companhia da esposa sob o argumento
de que era preciso economizar – melhor seria preparar um jantarzinho em casa ou
visitar amigos. Mas era visto ao lado de belas mulheres em animadas noitadas, sem
a menor preocupação com as contas astronômicas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Levou anos para descobrir a farsa que sempre fora o casamento. O alto preço que pagara por sua renúncia. Sentiu-se presa
à armadilha que ajudara a construir com seu silêncio. Vivia reclusa enquanto
ele enredava-se em aventuras amorosas. Já não era uma mulher jovem, mas ainda era capaz de transgredir, escapar ao conformismo, perseguir a vocação sufocada por tantos anos...<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; tab-stops: 195.15pt; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman", serif; font-size: 14pt;">Certo dia abandonou a casa sem nada explicar,
sem nada pedir, sem nada reivindicar. Os apelos do marido foram inúteis. Os
pedidos de perdão também. Pela primeira vez sentiu-se verdadeiramente livre.
Não guardava mágoa, ódio, nada. Renascia como a mulher livre que deveria ter
sido. </span></div>
<br />GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-92092305966869742322020-07-13T13:46:00.001-03:002020-07-16T21:11:02.165-03:00<br />
<br />
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">CONSELHO DE PAI<o:p></o:p></span></b></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: center; text-indent: 17.0pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Repugnava-lhe
a origens familiares, a infância pobre em uma comunidade carente e violenta. A
ascensão social era a sua razão de viver. Talvez a fizesse esquecer os anos de privações
e humilhações que permearam sua infância. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Exorcizava
os demônios em lojas requintadas. Os falsos elogios das vendedoras a
transportavam para o mundo glamoroso das socialites. Imaginava-se nos salões
grã-finos a arrancar suspiros com os requebros sensuais no vestido justo... afinal
esse era seu poder de sedução.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">E
danava-se a comprar. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">O
marido, apaixonado, satisfazia-lhe os desejos ainda que isso custasse
impagáveis empréstimos bancários e uma triste vida de aparências. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Ao
vê-la sair do vestiário, abraçada às peças escolhidas, nem pergunta o preço. Resignado, saca
o cartão de crédito, dirige-se ao caixa e, com imperceptível sorriso, lembra o inútil
conselho de seu velho pai, falecido há décadas:<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">–
Quando for casar, filho, escolha uma mulher pobre ou rica. Tanto faz. Desgraça
é esposar uma pobre metida a rica. Você cavará sua própria sepultura.<o:p></o:p></span><br />
<br /></div>
<br />GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-6718855576343008072020-07-13T12:26:00.003-03:002020-07-13T13:38:14.334-03:00<br />
<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">O ATOR E O FIGURANTE<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Ao
vê-lo no set de gravação, o velho ator desejou ardentemente seu corpo, sua alma
seu amor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">O
jovem figurante apenas viu a oportunidade de tornar-se um grande ator.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-margin-bottom-alt: auto; text-align: justify; text-indent: 17.0pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; font-size: 14.0pt;">Só
não sabia que a falta de talento o condenaria para sempre a figurante na vida
do velho ator.<o:p></o:p></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-10853170686246736742016-06-16T14:39:00.001-03:002016-06-19T13:03:16.791-03:00NIETZSCHE E O AMOR COMO APROPRIAÇÃO DO OUTROGeorge Sarmento<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844-1900) é considerado um dos filósofos mais importantes do pensamento ocidental. Suas ideias são controvertidas, surpreendentes, provocadoras, impactantes, alvo de infindáveis discussões acadêmicas. O autor de obras filosóficas de grande densidade como <i>E assim falou Zarathustra (1885), Além do Bem e do Mal (1886)</i> e <i>Ecce Homo</i> (1888) instiga e atrai estudiosos de todo o mundo. Ferrenho crítico da moral judaico-cristã, dedicou-se a desmascarar os preconceitos da sociedade de sua época, procurando interpretar o que se esconde por trás dos valores burgueses. Neste <i>post</i> desenvolvo alguns aspectos de sua crítica ao amor e ao casamento. Para quem não está disposto a visitar seus livros, recomendo <i>100 aforismos sobre o amor e a morte </i>(editado pela Companhia das Letras e Penguin), que reúne os principais escritos do filósofo sobre o tema. O organizador, Paulo César de Souza, teve o mérito de selecionar as passagens mais paradigmáticas sobre o amor - até então dispersas em várias de suas obras.<br />
<br />
<blockquote class="tr_bq">
Eis a questão: o que se pode entender por amor-paixão na filosofia nietzschiana?</blockquote>
<br />
Enquanto muitos acreditam que o amor é a manifestação mais pura do altruísmo e da devoção ao outro, Nietzsche sustenta que ele expressa o inato egoísmo que habita em cada um de nós, sobretudo o inesgotável desejo de se apropriar da pessoa amada. Não está em jogo a felicidade do outro, o exercício de sua auto-determinação, o agir sem a interferência de quem quer que seja. O que importa é o desejo de transformar em propriedade a pessoa que encarna o produto de nosso amor. Para o filósofo alemão, o amor sexual é a <span style="color: red;">materialização de nossa ânsia de propriedade</span>. Por isso "o amante quer a posse incondicional e única da pessoa desejada, quer poder incondicional tanto sobre a alma como sobre o corpo, quer ser amado unicamente, habitando e dominando a outra alma como algo supremo e absolutamente desejável". </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Para tomar posse do território sentimental não há limites: jogos de sedução, juras de amor, súplicas desesperadas, humilhações aviltantes, atos heroicos. Essas armadilhas fazem parte do discurso que se destina a persuadir a vítima a capitular sem impor condições. Ao aceitar a relação amorosa, ela cede inconscientemente uma grande parcela sua liberdade e permite a apropriação de sua vida amorosa. O<span style="color: red;"> amor, para Nietzsche, é uma insidiosa armadilha do egoísta</span>, que termina por saciar o seu desejo de conquista, abrindo caminho para outras formas de dominação.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;">O egoísta aspira ser o único alvo dos sentimentos da pessoa amada</span>. Acha que só ele é merecedor daquele amor. Por isso trata de isolá-la das relações sociais anteriores. Exige exclusividade e total devoção. Desenvolve um acentuado sentimento de ciúme e passa a ver ameaças em todos os lugares. De repente os amigos se afastam, escaceiam-se as visitas familiares, os clientes diminuem. Ele tenta persuadi-la que se tratavam de pessoas artificiais e invejosas, cuja partida trará grandes benefícios para o casal. Pouco a pouco começa a introduzi-la em seu universo, desenraizando-a de seu passado até roubar-lhe a subjetividade. O distanciamento dos entes queridos alimenta o processo de apropriação sobre o outro. Cria todas as condições para o exercício da posse, ainda que por meio de pequenas compensações. </div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Muitas vezes a vítima não se deixa seduzir e rompe a relação amorosa. Ao ver seus objetivos de dominação fracassarem, muitas pessoas passam a adotar uma postura submissa: vitimizam-se, prometem fidelidade eterna, abundância de bens materiais, choram copiosamente ou ficam deprimidas. Outras vezes são violentos e cruéis. <span style="color: red;">Por trás desses discursos, está latente o desejo de apropriação do outro</span>. Se ele cede, logo os atos de posse e de dominação reaparecem. Se a vítima não muda de ideia, o opressor sente profunda dor, o "chagrin d'amour" - fruto do orgulho ferido -, que só acaba quando as atenções voltam-se para outra vítima. E aí tudo recomeça.<br />
<br />
Para Nietzche, o fenômeno funciona mais ou menos assim: o rapaz (mas poderia ser a mulher) é apresentado a uma moça por amigos comuns e, de repente, se sente flechado pelo cupido, tem a sensação de ter sido atingido por um raio, passa a ver a vida sob outra perspectiva. <span style="color: red;">Inconscientemente brota nele o desejo de apropriar-se de sua "amada" para tornar-se exclusivo e imprescindível para ela</span>. Essa ideia domina seus pensamentos, enraíza-se em sua mente, conduz suas ações, fazendo-o acreditar que encontrou a outra metade de seu ser para fazê-lo eternamente feliz. Começa então um jogo de sedução cujo principal objetivo é conquistar o amor que ainda não tem. E aquilo que lhe falta transforma-se na coisa mais importante de sua vida. Às vezes o desejo de posse sequer é percebido pela razão, está escondido nos recônditos da psiquê. Se a moça aceita incondicionalmente o amor, faz concessões, cede sua liberdade. Capitula. Resultado: o desafio deixa de existir. A posse está consumada, o que é motivo de grande prazer, de verdadeiro regojizo momentâneo. Porém, com o tempo, não há mais mistério, o desejo começa a diminuir, o rompimento parece inevitável e logo ele vai em busca de novos territórios a serem ocupados. Se a moça não se deixa conquistar, o processo de apropriação se frustrará causando grande sofrimento ao amante rejeitado, que sofrerá profundamente até que seu interesse se volte para outra vitima. E aí tudo recomeça. Tudo isso ocorre porque o desejo de posse é indissociável da natureza humana, alimentando a vaidade, o orgulho e, muitas vezes, o machismo. Isso pode explicar a efemeridade dos amores contemporâneos tão bem descritos em várias obras de Zygmunt Bauman.<br />
<div>
<br /></div>
<span style="color: red;">A literatura judiciária está repleta de crimes motivados pela rejeição amorosa</span>. Na maioria dos casos, o criminoso não sabe lidar com a perda da posse, com o orgulho ferido, com a vaidade arranhada. Narrativa notável sobre o tema pode ser encontrada livro <i>Paixão e Crime</i>, escrito na década de 60 pelo polêmico jornalista Carlos Lacerda. Destacado para cobrir o julgamento do maître Pierre Jaccoud, eminente político e advogado suíço, acusado do assassinato de Charles Zumbach (pai de seu rival), Lacerda deparou-se com uma personalidade complexa, capaz de correr todos os riscos - inclusive a desgraça pública - para satisfazer seus desejos de apropriação. Ao traçar o perfil do acusado, até então considerado um cidadão acima de qualquer suspeita, revela uma alma dominadora, incapaz de aceitar o rompimento de sua amante, a jovem Linda Baud. Movido pelo egoísmo, Maître Jaccoud desenvolveu o complexo de Pigmaleão, pois quis transformar Linda Baud numa projeção de sua própria imagem, decidindo recriá-la, modelá-la, aperfeiçoá-la. Quando ela se recusou a representar o papel, o acusado entrou em desespero e decidiu praticar o crime. <br />
<br />
Por que o desejo de posse está tão incrustado no ser humano? Nietzche explica esse fenômeno pela propensão natural de auto-renovação. A posse significa a reintrodução de algo novo em nós mesmos, funciona como a reinvenção de nossa subjetividade. É motivo de verdadeiro regojizo. "Meu marido", "meu apartamento", "minha casa", "minha viagem", "minhas joias", tudo isso tem sabor irresistível no momento da apropriação. O problema é que logo nos cansamos dos objetos ou pessoas e partimos em busca de outras conquistas, já que uma posse será sempre substituída por outra posse. "Enfadar-se de uma posse é enfadar-se de si mesmo", diz o filósofo. Por isso, <span style="color: red;">o amor nada mais seria que o desejo de nova posse que alimenta e faz com que a conquista seja motivo de grande prazer.</span><br />
<span style="color: red;"><br /></span>
Outro aspecto importante do pensamento de Nietzche - com evidente influência de Kant - é a constatação da impossibilidade de se controlar os sentimentos amorosos para garantir as expectativas do outro. O sentimentos suplantam a racionalidade. São ingovernáveis pela razão. <span style="color: red;">Quando prometemos amor eterno, mentimos (ou nos enganamos); afirmamos algo que não podemos garantir</span>. O máximo que se pode fazer é prometer atos específicos, ainda que tenham motivações distintas. Para ele, a promessa de amar eternamente alguém significa: "enquanto eu te amar, demonstrarei com atos o meu amor; se eu não mais te amar, continuarei a praticar esses mesmos atos, ainda que por outros motivos". Exemplo: a mulher apaixonada cerca o homem de cuidados, gentilezas, respeito e doçura; por sua vez o homem com o coração pleno de amor age com cavalheirismo, cumplicidade, carinho e fidelidade. Acreditam que será assim para sempre. Aspiram a sensação de plenitude. Mas se um deles deixa de amar, o outro poderá continuará a praticar os mesmos atos sem que isso implique contradição ou hipocrisia.<br />
<br />
Nietzche é contrário à ideia de igualdade de gênero. Para ele, existe verdadeira assimetria entre os direitos do homem e da mulher no amor. As condutas são guiadas pelo determinismo genético, que não pode ser modificado por contrato social ou desejo de justiça. O amor possui significados absolutamente distintos a depender do sexo. A mulher vê o amor como dedicação e entrega incondicional ao homem escolhido, o que implica total renúncia de direitos e fidelidade absoluta.<br />
<br />
Por outro lado, o homem anseia por dedicação, que é o principal componente da posse conquistada. Daí Nietzche afirmar que "a mulher quer ser tomada e aceita como posse, quer ser absorvida na noção de <i>posse</i>, de <i>possuído</i>". <span style="color: red;">Para o homem, o amor resume-se a um querer-ter, o que não comporta renúncias ou concessões</span>. Se o homem age como mulher, agindo com profunda generosidade, transforma-se em escravo e atrai o desprezo do sexo oposto. Assim, o papel de cada cônjuge estaria bem delimitado com a satisfação de expectativas cognitivas orientadas pela natureza das coisas. Esse equilíbrio só seria quebrado se o homem decidisse se distanciar de sua condição de dominador. Se, por amor, ambos abrissem mão do poder, o resultado seria um verdadeiro vazio existencial que terminaria por infernizar suas vidas.<br />
<br />
Em sua formulação teórica, <span style="color: red;">o casamento surge como a mais alta forma de amizade espiritual entre pessoas de sexo diferente</span>. Por isso não pode ser baseado no amor. Os casais apaixonados deveriam ser proibidos de tomar decisões sobre esse importante passo da vida, pois vivem em estado alterado da consciência. Sob o efeito do que supõem ser amor - frequentemente confundifo com paixão - eles sempre vêem as coisas como não são, pois a força da ilusão está no seu apogeu. Nessa condição perdem a noção de realidade e passam a ver as coisas distorcidas. Nietzche também é partidário dos casais que vivem em casas separadas, decisão essencial para o bom casamento. Em suas palavras: "se os cônjuges não morassem juntos, os bons casamentos seriam mais comuns". A distância geográfica entre os cônjuges aumentaria o clima de mistério e prolongaria a ruptura inevitável, pior ainda, a falta de interesse pela pessoa conquistada.<br />
<div style="text-align: justify;">
</div>
<br />
<span style="color: red;">Ao invés de satisfação sexual, o matrimônio tem como objetivo maior gerar e educar uma nova geração</span>. O amor sobreviveria na prole que, em tese, seria a garantia da perpetuidade da espécie. Ele chega a recomendar a adoção de concubina para desempenhar o papel de elemento sexual suplementar a fim de aliviar a carga que recai sobre as costas da mulher na administração do lar. A boa esposa está plenamente ocupada em ser boa amiga, ajudante, genitora, mãe, cabeça da família, administradora etc.<br />
<br />
Portanto, as relações sexuais não seriam determinantes para a manutenção do casamento. Nietzche sustenta que as afinidades intelectuais e de gostos são indissociáveis da vida a dois. A convivência pressupõe diálogo entre os cônjuges. Mais do que isso, está baseada no prazer da conversa, da convivência, da cumplicidade. A afinidade dos laços matrimoniais se constrói a partir da prática dialógica. O casamento é, acima de tudo, uma longa conversa. Com a palavra o filósofo: "<span style="color: red;">ao iniciar um casamento, o homem deve se colocar a seguinte pergunta: você acredita que gostará de conversar com essa mulher até na velhice? Tudo o mais no casamento é transitório, mas a maior parte do tempo é dedicada a conversa</span>". Penso nisso quando vejo longos silêncios entre casais em restaurantes, que mal se olham e cujas companhias nada mais são que um espectro de um passado cheio de mágoas e rancores.<br />
<br />
As ideias de Nietzche fustigam a moral judaico-cristã, colocando em dúvida os seus valores e convicções. Muitas vezes dando uma visão árida do amor - sentimento no qual depositamos todas as esperanças. Temos dificuldade em perceber esse sentimento tão doce como uma forma de dominação do mais fraco, de apropriação, de posse. Pode-se até mesmo discordar de tudo que ele defende, sobretudo de seu pessimismo em relação à nossa felicidade. Mas é inegável que o pensamento do filósofo alemão é rico, autêntico, corajoso e revolucionário, pois nos convida a retirar as máscaras da face para que nos percebamos tal como fomos criados, sem o verniz da civilização. Cruamente. Sem subterfúgios.<br />
<br />
<div style="text-align: center;">
<b>PARA REFLEXÃO: OUTROS AFORISMOS DE NIETZCHE</b></div>
<div style="text-align: center;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
<ul>
<li>Após uma desavença e disputa pessoal entre uma mulher e um homem, uma parte sofre mais com a ideia de ter magoado a outra; enquanto esta sofre mais com a ideia de não ter magoado o outro o bastante, e por isso se empenha depois, com lágrimas, soluços e caras feias, em lhe amargurar o coração.</li>
<li>Às vezes bastam óculos mais fortes para curar um apaixonado; e quem tivesse força de imaginação para conceber um rosto, uma silhueta vinte anos mais velha, talvez passasse pela vida imperturbado.</li>
<li>Em toda espécie de amor feminino também aparece algo do amor materno.</li>
<li>Para a doença masculina do autodesprezo o remédio mais seguro é ser amado por uma mulher inteligente.</li>
<li>o que é o amor, senão compreender que que um outro viva, aja e sinta de maneira diversa e oposta da nossa e alegrar-se com isso?</li>
<li>Todo grande amor traz consigo o cruel pensamento de matar o objeto do amor, para subtraí-lo de uma vez por todas ao sacrílego jogo da mudança: pois o amor tem mais receio da mudança que do aniquilamento. </li>
</ul>
</div>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com15tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-49322046435150952952016-06-02T14:50:00.002-03:002016-06-17T07:53:04.313-03:00SEM NEXOGeorge Sarmento<br />
<br />
Ela desejava sexo...<br />
Eu desejava amor.<br />
Já vivi para o sexo,<br />
Mas faltava-me o amor.<br />
Tentei inverter as coisas.<br />
Ela rompeu comigo:<br />
Fiquei sem sexo e amor.GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-22880987500550014922013-12-22T23:38:00.000-03:002013-12-23T13:30:45.635-03:00O MEU PAPAI NOELGeorge Sarmento<br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;">Fui uma criança que acreditou ardentemente em Papai Noel.</span> A crença em sua existência foi o meu primeiro dogma. O velhinho risonho, de bochechas coradas, barbas alvas e longas, era pura bondade. Fascinava-me o seu jeito democrático de visitar os lares e realizar os sonhos dos pequeninos de todos os continentes. Por onde passava distribuía alegria, confortava os enfermos, reacendia a esperança nos corações.</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;">Ele também era puro mistério.</span> Entrava e saia das casas de forma espetacular, surpreendente. Rápido e astuto, ninguém conseguia vê-lo ou detê-lo. Eu esperava ansiosamente sua visita até ser vencido pelo sono. Ao acordar corria para a árvore de natal. Olhava extasiado os pacotes coloridos em busca dos presentes que me cabiam: carrinhos, bolas de gude, espadas de plástico, máscaras de super-heróis. Certo dia meu pai irrompeu no quarto e, ofegante, afirmou ter surpreendido o bom velhinho, mas ele tinha escapado. Guardava em suas mãos o chumaço da barba branca e uma grande caixa lindamente embrulhada. Era a prova definitiva de sua presença em nossa casa.</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;">Meu coração de criança ainda não tinha sido apresentado às misérias do mundo.</span> Sequer suspeitava das injustiças sociais, da pobreza, da forme, da inveja e do ódio. Nesse natal ganhei de presente uma bola de couro. Dormi abraçado a ela sonhando com a pelada do "campinho do cajá", que reunia os garotos das redondezas. <span class="Apple-style-span" style="-webkit-composition-fill-color: rgba(175, 192, 227, 0.230469); -webkit-composition-frame-color: rgba(77, 128, 180, 0.230469); -webkit-tap-highlight-color: rgba(26, 26, 26, 0.292969);">Seria uma novidade, já que usávamos sempre uma de plástico - a conhecida <em>bola dente de leite</em>. Não sei como, mas alguém furou a couraça por pura maldade. Protestei dizendo que havia sido um presente de Papai Noel. Alguns desdenharam de minhas certezas até então inquebrantáveis. Juravam que ele não existia, que era pura invenção dos adultos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;">Foi assim que descobri a verdade.</span> Saber que se tratava de invenção decepcionou-me mais que a covardia de que fora vítima. Ele era meu amigo fiel, ouvia meus desejos, lembrava-se de mim todos os anos. A constatação de que tudo era irreal foi decepcionante. Talvez esse tenha sido o fim de minha infância e a preparação para a difícil adolescência. Eu cursava o primário numa escola pública frequentada por crianças de todas as classes sociais. Até então não tinha percebido as contradições de uma sociedade injusta, marcada pela violência e pela péssima distribuição de renda. E esse foi o começo do longo aprendizado em torno dos valores éticos que plasmariam meu caráter.</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;">O tempo passou e ainda hoje o personagem Papai Noel me fascina.</span> Não pelas roupas vermelhas ou pelo trenó puxado por renas que corta as noites de natal. Tampouco pelos elfos mágicos que o cercam. Mas pelos bons sentimentos que ele evoca por onde passa. Sobretudo por prolongar a pureza da infância, por tornar bela a espera, por fazer brilhar os olhinhos inocentes diante da realização de um sonho doce e efêmero. <br />
<span style="color: red;">Hoje sei que o Papai Noel vive dentro de mim.</span> É o arquétipo de generosidade, indulgência e acolhimento. É a utopia que pulsa e me impele a ser uma pessoa melhor, mais comprometida com o progresso moral e os ensinamentos cristãos. No natal procuro resgatar a criança que um dia fui e me presenteio com algo que me faça feliz. É a autocompensação por mais um ano vivido. Por não ter sucumbido ao desânimo, à indiferença e à acomodação. Mas também gosto de ficar sozinho e pensar em todas as pessoas queridas, vivas e mortas, que foram imprescindíveis para que eu trilhasse até aqui os sinuosos caminhos da vida. Tudo para lhes agradecer as ações edificantes ou pedir-lhes perdão pelos sofrimentos que, consciente ou inconscientemente, causei dada a imperfeição de minha humanidade.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-77242310215146986512013-11-17T13:41:00.002-03:002013-11-17T16:55:29.672-03:00VISITA ÀS UNIVERSIDADES EUROPEIAS<br />
<strong>George Sarmento</strong><br />
<br />
<div style="text-align: justify;">
Em 2013 fui convidado pelo professor Fábio Lins para acompanhar o grupo de alagoanos que participava da <span style="color: red;"><strong>2a Visita às Universidades Europeias</strong></span>, um projeto pioneiro que tem o objetivo de apresentar a estudantes, profissionais liberais, funcionários públicos e pesquisadores a efervescência da vida em torno das mais antigas faculdades do Velho Continente. </div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
O roteiro universitário era sedutor: Coimbra, Salamanca, Montpellier e Bolonha. A caravana também passaria por outras cidades encantadoras, como Lisboa, Barcelona e Roma. A ideia era percorrer as dependências das seculares instituições, conhecer seus dirigentes e professores. Além disso, passear pelas ruas das cidades, visitar monumentos históricos, conhecer a gastronomia local.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
No dia da partida, um lamentável incidente. Movido pelo entusiasmo da viagem, não conferi a validade de meu passaporte. Bagagens despachadas e de posse do meu cartão de embarque, fui informado pelos policiais federais que ele vencera naquele exato dia. Se esse detalhe não tivesse sido percebido por um agente zeloso e atento, eu sequer entraria em território português. Era inútil insistir. A situação tinha de ser encarada com objetividade. Despedi de meus companheiros e prometi encontrá-los em algum ponto do trajeto. Afinal, era um dos monitores e principal responsável pelo grupo em terras francesas.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
Solicitei um passaporte de emergência, válido por um ano. Depois de horas de consultas aos sites de viagem, comprei um bilhete de avião para Barcelona. No dia seguinte encontraria toda delegação, que me acolheu carinhosamente, entre risos e brincadeiras. Minutos depois já estava perfeitamente integrado ao grupo e pronto para seguir viagem. Aproveito este espaço para agradecer a gentileza do professor Querino Malmann, que foi responsável pela mala desgarrada (grande e pesada) durante os dias de minha ausência.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
As faculdades visitadas foram verdadeiros marcos do conhecimento científico ocidental - responsáveis pela formação intelectual de importantes juristas, políticos e homens de letras. Venceram as barreiras do preconceito e da intolerância para defender valores universais que até hoje influenciam o pensamento contemporâneo.<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjPrSXdsuiuypUHbGUS_gd6Rk9g2g-FQMcHRJcb5ZbAkIKT1fEgPlfs9hLeFFaWw4Byc9WkGBYSUYOI-7R3MFwd0ppfr5Ikan41EuFD8yMksPdxvgYW4zeWdUtl6veDsDqxS7toRoPHBHcZ/s1600/2013-03-28+23.07.16.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="300" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjPrSXdsuiuypUHbGUS_gd6Rk9g2g-FQMcHRJcb5ZbAkIKT1fEgPlfs9hLeFFaWw4Byc9WkGBYSUYOI-7R3MFwd0ppfr5Ikan41EuFD8yMksPdxvgYW4zeWdUtl6veDsDqxS7toRoPHBHcZ/s400/2013-03-28+23.07.16.jpg" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Interior da Faculdade de Direito de Bolonha: Alma Mater Studiorum</td></tr>
</tbody></table>
<br />
<br />
<span style="color: red;"><strong>Universidade de Bolonha</strong></span>: Universidade mais antiga da Europa, data de 1088. É Conhecida como a <em>Mater Universitas</em> (mãe das universidades). Foi lá que estudaram personagens como Dante Alighieri e Benjamin Franklin. Ainda hoje tem um excelente quadro de professores entre eles Umberto Eco e Romano Prodi.<br />
<br />
Em 1158, os estudantes de direito foram beneficiados com a concessão de diversos privilégios pela Constituição Habita, do Imperador Frederico I. A partir daí eles passaram a se organizar em nações, que foram a semente da Universidade de Bolonha. Ainda hoje goza de grande prestígio nos meios acadêmicos e é procurada por estudantes de todos os continentes interessados em aprimorar seus conhecimentos jurídicos.<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgI5OHf-UOw_sQxWXtThI9_k1m8hxj4wt2fuehYGfexzoXk08pPGU5buPxCmAGpyyS6ExNblOQGdcsYJWpXjvhN7LdA_Gkzz7Uu0kQlWxr0y3ihZsfOlb4drBgz19AIVDHYV8mL9KQwMAPT/s1600/2013-03-28+23.09.09.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="300" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgI5OHf-UOw_sQxWXtThI9_k1m8hxj4wt2fuehYGfexzoXk08pPGU5buPxCmAGpyyS6ExNblOQGdcsYJWpXjvhN7LdA_Gkzz7Uu0kQlWxr0y3ihZsfOlb4drBgz19AIVDHYV8mL9KQwMAPT/s400/2013-03-28+23.09.09.jpg" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Universidade de Bolonha: Querino Malmann, George Sarmento, Thiago Bonfim e Fábio Lins</td></tr>
</tbody></table>
</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
<strong><span style="color: red;">Universidade de Coimbra</span></strong>: fundada em 1288, sob o reinado de D. Dinis (dois anos depois confirmada pela Bula do Papa Nicolau IV), formava professores que poderiam ensinar em qualquer parte do mundo cristão. A partir do século XVI passou a formar juristas e doutrinadores extremamente respeitados em toda a Europa. Nos séculos XVIII e XIX acolheu centenas de jovens brasileiros, que voltaram ao país para formar uma elite política que seria responsável por importantes transformações sociais. Instalada em prédio de inestimável valor histórico, destaca-se pela majestosa Biblioteca Joanina.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
Tive a honra de conhecer o reitor António Avelãs Nunes em 2002. Fomos debatedores em mesa redonda que aconteceu em congresso realizado pelo Ministério Público de Alagoas. Anos depois proferi discurso de saudação em sua posse como professor <em>honoris causa</em> da Universidade Federal de Alagoas. Com a criação do Mestrado em Direito da UFAL, doou centenas de livros de juristas portugueses para fortalecer nosso programa de pós-graduação. Entre os futuros doutores da Faculdade de Direito de Coimbra estavam os professores alagoanos Wlademir Lira e Thiago Bonfim.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
Jurista de renome, crítico ferrenho do neoliberalismo, é uma das grandes amizades que fiz na vida acadêmica. Por ocasião da aposentadoria - ou jubilamento, como preferem os lusitanos), fui convidado para escrever um capítulo do livro <em>Liber Amicorum</em> em sua homenagem, obra coeditada pela Editora Coimbra. Durante a visita da delegação alagoana, proferiu memorável palestra sobre a história da instituição.<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmaFul6wCDyyv_dFhvsvwMsTXbVb0GF9Xk3_RH5Jm0YaV8amjwfaU_RVZ3DunCUk-bL0IyKM7tUoOJHM0pg-rFlUqQ5gUzrP0_jZsyz-0uRT2REO81uT1MDo5thMEtDJdHhD3h6Nz6DuzJ/s1600/imagesCAWRFZ9W.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="243" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmaFul6wCDyyv_dFhvsvwMsTXbVb0GF9Xk3_RH5Jm0YaV8amjwfaU_RVZ3DunCUk-bL0IyKM7tUoOJHM0pg-rFlUqQ5gUzrP0_jZsyz-0uRT2REO81uT1MDo5thMEtDJdHhD3h6Nz6DuzJ/s400/imagesCAWRFZ9W.jpg" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Suntuosa Biblioteca da Universidade de Coimbra: extraordinário acervo de livros raros</td></tr>
</tbody></table>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: red;"><strong>Universidade de Montpellier</strong></span>: Sua criação data de 1220, mas o reconhecimento pela Igreja Católica só aconteceria 1289, quando Nicolas IV autorizou o ensino de direito, medicina e artes. Montpellier ficou conhecida como uma cidade de refugio e exilio de intelectuais perseguidos por questões religiosas e políticas. Por muito tempo cristãos, muçulmanos e protestantes conviveram pacificamente, o que favoreceu o desenvolvimento da medicina e do direito. Já foi palco de grandes acontecimentos históricos, inclusive o fechamento de suas portas e perseguição aos professores. Augusto Comte, o mentor do positivismo, foi um dos seus alunos mais destacados.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
No século XVIII, recebeu jovens brasileiros de formação liberal que, mais tarde, pregariam valores republicanos em sua terra natal. O chamado Grupo de Montpellier era formado por 15 alunos de medicina, que se engajaram em movimentos políticos para a libertação do Brasil do colonialismo português, a exemplo da Confederação do Equador e a Inconfidência Mineira. Movidos pelo fervor revolucionário da época e alimentados por ideias anti-monarquistas, os estudantes voltaram dispostos a conquistar a independência do país através da revolução, assim como fizeram os norte-americanos.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
Tive a honra de atuar como professor convidado na Universidade de Montpellier I. Durante o período em que desenvolvi meus trabalhos, fiquei encantado com a vida universitária da cidade. Milhares de alunos nas ruas, atividades culturais e artísticas. Restaurantes e cafés sempre cheios. Depois fui coordenador de convênio que a instituição celebrou com a UFAL, e indiquei alguns alunos brasileiros para cursar disciplinas na Faculdade de Direito. Ainda hoje mantenho com ela fortes laços de cooperação científica.<br />
<br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPZqd55O-w5Ri85t7Nz8fmbLyzNSUPlMrtIY86sYK_MSQb3apE_a17mzVHwrwkeoU39M_07fb042fgxv-oExGDbf8WfPp2fZimj2Di8iw_-LRcHc0OqNyIrM04KsnokjwYleHj8JcesxL8/s1600/DSC00892.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="300" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPZqd55O-w5Ri85t7Nz8fmbLyzNSUPlMrtIY86sYK_MSQb3apE_a17mzVHwrwkeoU39M_07fb042fgxv-oExGDbf8WfPp2fZimj2Di8iw_-LRcHc0OqNyIrM04KsnokjwYleHj8JcesxL8/s400/DSC00892.JPG" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Universidade de Montpellier (foto do autor)</td></tr>
</tbody></table>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<strong><span style="color: red;">Universidade de Salamanca</span></strong>: é considerada a mais antiga universidade da Península Ibérica e uma das mais tradicionais e renomadas da Europa. Salamanca é uma cidade efervescente, tipicamente estudantil. Fundada em 1218 pelo Rei Afonso X, foi um grande centro científico durante o período medieval. Com o descobrimento das Américas, deu extraordinária contribuição para o debate sobre os direitos dos povos indígenas, tema inédito nos meios acadêmicos da época.<br />
<br />
A comitiva alagoana foi recebida por importantes dirigentes da instituição, que proferiram conferência magna sobre a história e os cursos ali ofertados, tudo sob a supervisão do professor Fábio Lins, que defendeu tese de doutorado na Faculdade de Direito de Salamanca.<br />
<br />
Faço esses registros por dois motivos. O primeiro para enaltecer a grande iniciativa do colega Fábio Lins em desenvolver esse importante projeto cultural, que permitiu a todos conhecer muito da história das ciências e do ensino superior. Em segundo lugar para estimular milhares de estudantes que sonham ampliar seus horizontes em universidades estrangeiras. A inciativa distanciou-se do lugar comum de que viagens se resumem a compras e baladas, mas mostrou que também podem o ser o testemunho do longo percurso trilhado pela humanidade em busca do saber e da civilidade.</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-22839914228824909852013-11-03T21:33:00.003-03:002013-11-17T16:34:11.260-03:00QUATRO ANOS DEPOIS<div align="justify">
George Sarmento</div>
<div align="justify">
</div>
<div align="justify">
</div>
<div align="justify">
Quase 4 anos. Esse foi o tempo em que o blog mergulhou no mais eloquente silêncio. Meu movimento cotidiano foi tão intenso que calou temporariamente o <strong><span style="color: red;">Cotidiano em Movimento</span></strong>. Enciumado pelo abandono, ele começou a protestar, incomodar, denunciar a acomodação. Tanto o fez, e com tanta intensidade e ousadia, que cedi aos seus apelos. </div>
<div align="justify">
Ele provocava sem piedade:</div>
<div align="justify">
-Você não pode silenciar a palavra que vive dentro de você.</div>
<div align="justify">
- Mas ela é inútil - retruquei tentando me esquivar. - Ninguém quer ouvi-la, tampouco lê-la. Há tanta coisa importante por aí...<br />
O blog não desiste nunca:</div>
<div align="justify">
- Durante sua ausência mais de 3 mil pessoas me visitaram. E tem mais: do Brasil e do exterior! <br />
- Verdade? - perguntei, surpreso.<br />
- Não estou dizendo? Agora não dá mais, George. Vamos lá, coragem!<br />
Fiquei pensativo. Como relegá-lo, assim, sem dizer nada? Ele que, por tanto tempo, foi meu alter ego, meu estandarte, minha voz.<br />
Resolvi propor-lhe um acordo:<br />
- Façamos assim: voltarei de mansinho, sem alarde. Prometo revirar a memória, desencavar fatos pitorescos, interpretar o dia-a-dia. Tudo ao meu ritmo, sem cobranças, está entendido?<br />
Ele apertou minhas mãos e depois deu-me um abraço afetuoso, dissimulando uma furtiva lágrima de emoção que insistia em brotar de seu olho (o outro estava cerrado, não me pergunte por quê).<br />
E assim, queridíssimos amigos, despedimo-nos com os corações plenos de esperança e contentamento.<br />
Deu alguns passos e gritou sem se virar:<br />
- Não esqueça a promessa! Serei um cobrador implacável.<br />
Olhou-me de soslaio e desapareceu na rua da memória.<br />
</div>
<div align="justify">
</div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-30451238982354904642010-02-14T19:42:00.009-03:002010-02-14T20:27:59.677-03:00O POUSO NA CHAMPS-ELYSÉES<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj192Fcx96h3BQ5998JjI1kYguUIDxZs-naJjJ365UIzDgEEEePJQ_TXTTaj-52jjC9bPOZeiftTtcVQTDFEDRDTDetORvmUkT0Ae1msQ85ZYmu0p2c3WARAdRVN0D6QDHN4pZfWW-kNIQU/s1600-h/vanessa2%5B1%5D.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 320px; DISPLAY: block; HEIGHT: 240px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5438235499200287794" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj192Fcx96h3BQ5998JjI1kYguUIDxZs-naJjJ365UIzDgEEEePJQ_TXTTaj-52jjC9bPOZeiftTtcVQTDFEDRDTDetORvmUkT0Ae1msQ85ZYmu0p2c3WARAdRVN0D6QDHN4pZfWW-kNIQU/s320/vanessa2%5B1%5D.jpg" /></a><br /><div><div align="justify"><span style="color:#000000;">Os brasileiros que passeiam pela elegante Avenida Champs-Elysées, em Paris, deveriam olhar com muito orgulho o prédio 114. Ali morou Santos Dumont. Mais ainda: foi também o lugar onde posou o Dirigível n. 9, sob os olhares perplexos de milhares de franceses. Além de morar no local mais nobre da cidade, o cara era ousado. Em 1903, nada de chegar em casa de nos modernos automóveis que encantavam a burguesia. Autenticidade era a palavra de ordem. Depois de sobrevoar a Cidade Luz num frágil balão, tinha mesmo que pousar na porta de casa para comemorar o feito com muito champagne.<br /></span>Santos Dumont foi morar na França aos 20 anos de idade, onde seguiu estudos superiores. Sua primeira grande invenção foi o Balão Brasil, assim batizado em homenagem à terra natal. Depois vieram outros, até a construção do 14 BIS, que o celebrizou como o pai da aviação mundial. </div><div align="justify">Enquanto espero o avião que me conduzirá ao Brasil depois dessa breve temporada parisiense, penso na grande contribuição que Santos Dumont deu para a humanidade: um meio de transporte que encurta distâncias e aproxima pessoas de todos os continentes.<br />Visitei algumas vezes sua casa em Petrópolis. Um sobradinho acolhedor e cheio de criatividade. Uma mostra da genialidade de seu proprietário. Todos ficam impressionados com o formato da escada, o sistema de aquecimento d’água, entre outras invenções inusitadas. Pouca gente sabe, mas ele também foi o inventor do relógio de pulso, ornamento tão comum na contemporaneidade. Santos Dumont suicida-se em 1932, desgostoso por ver que os aviões que ele ajudou a construir tinham-se tornado máquinas de guerra. O golpe foi muito forte para a sua frágil saúde física e mental. </div></div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-66641168366589118522010-02-07T13:58:00.012-03:002012-10-24T23:49:04.572-03:00MINHA VISITA A AUGUSTE COMTE<strong><span style="color: #000099;">GEORGE SARMENTO</span></strong><br />
<div align="justify">
Quando entrei na Faculdade de Direito, no final dos anos 70, tive as primeiras noções da dicotomia <strong><span style="color: #000099;">direito natural</span></strong> x <span style="color: #990000;"><strong>direito positivo</strong></span>. O primeiro marcado pela inspiração divina ou pela natureza humana. O outro, fruto do pensamento científico, racional, indutivo. Representava a vitória da ciência sobre a superstição, o empirismo e o apriorismo que dominaram todo o pensamento medieval.<br />
<br />
Os professores esforçavam-se ao máximo para demonstrar o caráter científico do Direito. Pontes de Miranda, o maior jurista brasileiro de todos os tempos, defendia vivamente a positividade e afirmava que a incidência da norma jurídica sobre o suporte fático era a origem de toda a juridicidade, que se desenvolvia num universo virtual: <strong><span style="color: black;">o mundo do direito</span></strong>. Exilado nos Estados Unidos, Hans Kelsen também concebia um sistema de ciência pura do direito, uma tentativa de separá-lo das demais ciências sociais.<br />
<br />
O que os mestres não explicavam é que o normativismo nada mais era que o positivismo aplicado ao Direito. Mesmo que não queiram admitir, o positivismo de Auguste Comte (1798-1857) está na origem das chamadas ciências jurídicas. Ele foi o primeiro filósofo a defender com todas as letras que o século XIX decretara o fim do obscurantismo científico. Era chegado o momento de a sociologia atingir a sua dimensão positiva, da mesma forma que a física e as matemáticas.<br />
<br />
Auguste Comte... <span style="color: black;">Quem foi esse homem paradigmático que influenciou os proclamadores da República Brasileira? Que foi fonte de inspiração para os grandes juristas nacionais do começo do século 20? Mesmo tendo lido os seus textos mais conhecidos, resolvi visitar seu apartamento parisiense a fim de conhecer melhor o seu universo intelectual.</span><br />
<br />
Pego o metrô e desço na estação Odeon, em pleno Quartier Latin, a fim de visitar o imóvel onde o filósofo viveu os últimos 16 anos de sua vida. Fica num prédio construído no século 18 e o apartamento jamais foi ocupado por outros moradores desde a morte de Comte. Seus discípulos não permitiriam tal afronta ao monstro sagrado.<br />
<br />
A primeira surpresa que tive, foi saber que o imóvel foi totalmente restaurado em 1960, a expensas de Paulo Carneiro (1901-1982), um químico brasileiro, que foi também diplomata na UNESCO. Ele teve a idéia de criar um museu e preservar todos os objetos pessoais do filósofo, inclusive a biblioteca, a mesa de trabalho e todo o mobiliário original.<br />
<br />
Localizado na Rue Monsieur Le Prince, 10, o apartamento também abriga a Associação Maison d’Auguste Comte, criada em 1954. Além da visita ao museu, ela possui um vastíssimo acervo cultural e bibliográfico. São obras raras escritas por seus discípulos, teses de doutorado, biografias e toda a correspondência que ele mantinha com os intelectuais da época. Também fica claro que seu sistema filosófico exerceu forte influência sobre as gerações que se seguiram, a exemplo de Émile Durkheim, Stuart Mill, Littreé e, até mesmo sobre Kropotkine – o grande anarquista russo.<br />
<br />
Ao tocar a campainha, a porta abriu automaticamente. Notei que o funcionário ficou surpreso. Era um jovem doutorando de filosofia, às vésperas de defender sua tese na Sorbonne. Nada a ver com o positivismo. Talvez estivesse no emprego apenas para pagar seus estudos. Disse-me que há mais de um mês o espaço não era visitado por ninguém, mesmo sendo o único museu de Paris consagrado a um filósofo francês. Nem mesmo Descartes recebeu tal honraria, comentou. O fato é que, durante 2008, apenas 685 pessoas passaram por ali, contando os grupos e eventos públicos. Mas, nos últimos anos, o número baixou significativamente.<br />
<br />
Além disso, poucos livros foram publicados sobre a vida e obra de Comte. Seu pensamento não resistiu à pós-modernidade. Nesses tempos de neoconstitucionalismo, poucos tem coragem de se dizerem positivistas por medo de serem tachados de conservadores ou retrógrados. A cada dia a retórica jurídica ganha mais espaço na vida judiciária, e o discurso científico-positivista tem sido substituído pela hermenêutica concretizadora dos direitos fundamentais no Brasil.<br />
<br />
Nascido em Montpellier, Comte desenvolveu sua formação acadêmica na renomada Escola Politécnica de Paris, onde adquiriu sólida formação científica. A partir de 1817 começa a construir os postulados de sua filosofia positiva. Cria o vocábulo sociologia e publica em 1821 a obra <span style="color: black;">“<em>Trabalhos científicos necessários para reorganizar a sociedade</em>”.</span> Casa-se com Caroline Massin, com quem tem uma relação tumultuada e infeliz. Em 1826 é vítima de uma crise de loucura e é internado na Clínica do Dr. Esquirol. Tenta o suicídio, mas consegue se reequilibrar.<br />
<br />
Nos anos seguintes retoma os seus cursos de filosofia, atraindo grande número de discípulos. Em 1842, publica seu <em><span style="color: black;">Curso de Filosofia Positiva</span></em>, obra que tem repercussão mundial, colocando-o no epicentro dos grandes pensadores do Século 19.<br />
<br />
Sua vida sofre grande mudança quando conhece a jovem Clotilde de Vaux em 1845. Já separado de sua primeira esposa, Comte se vê perdidamente apaixonado pela jovem discípula. A perplexidade desse sentimento na maturidade deve-se ao fato de o filósofo não acreditar que a afetividade seja apreendida pela ciência. Procura na religiosidade as respostas para suas inquietações. Embora o romance só tenha durado um ano – sua musa morre de tuberculose –, Conte se mantém fiel a esse amor até o fim de sua vida.<br />
<br />
Cria a <span style="color: black;">Religião da Humanidade</span>, engaja-se em movimentos sociais de defesa do proletariado. Institui a Sociedade Positivista para a educação dos povos. O positivismo ganha uma dimensão política na medida em que se propõe a restruturar a sociedade, resgatando-a do caos em que se encontrava mergulhada. A ciência e o progresso seriam os grandes motores de transformação. Sua militância política incomoda Napoleão III, que o destitui de sua cátedra da Escola Politécnica em 1854.<br />
<br />
A visita ao apartamento de Comte revela algumas características de sua personalidade. Ele só escrevia diante do espelho, pois tinha a necessidade de ter contato permanente com sua própria imagem. Ele também criou uma biblioteca básica do proletariado, composta porexatamente150 livros, considerados básicos para a instrução pública. A cadeira utilizada por Clotilde encontra-se no mesmo lugar de costume, sem qualquer tipo de restauração – já que seus seguidores acreditam na dimensão divina de seu amor pela jovem francesa.<br />
<br />
A obra de Comte teve enorme repercussão no Brasil. No Rio de Janeiro foi construída uma Igreja Positivista, onde uns poucos fiéis ainda cumprem a liturgia deixada por seu mentor. O filósofo morreu em seu leito, cercado de discípulos, deixando um grande legado para a humanidade. Os seus restos mortais repousam no Cemitério Père Lachaise. Ao deixar o apartamento, não pude deixar de notar a bandeira brasileira, que ostenta uma das mensagens do mestre de Montpellier: <span style="color: #006600;"><strong>ordem</strong></span> <span style="color: black;"><strong>e</strong></span> <strong><span style="color: #000099;">progresso</span></strong>.</div>
<div align="justify">
</div>
<div align="justify">
</div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-70582661213363196522010-02-03T10:51:00.007-03:002010-02-19T07:03:22.447-03:00CARIDADE NÃO É OBRIGAÇÃO<div align="justify"><span style="color:#000099;"><strong>GEORGE SARMENTO</strong></span><br /><br />Fiquei surpreso quando minha professora de direito do trabalho anunciou sua aposentadoria. Era uma mulher ainda jovem e ativa, que gozava de excelente saúde. Perguntei-lhe a razão da repentina decisão. Ela respondeu:<br /><br />- Já dei minha contribuição ao magistério. Agora pretendo dedicar-me ao voluntariado. Estou à procura de uma instituição que faça trabalho filantrópico para que eu possa ajudar. A caridade... Acho que esse é o sentido da vida.<br /><br />Alguns meses depois, reencontrei-a na rua e perguntei-lhe:<br /><br />- Como vai a ajuda aos necessitados? A senhora está militando em que instituição?<br /><br />- Meu amigo, ela respondeu, a coisa mais difícil do mundo é ajudar os pobres. Ofereci meus préstimos a várias instituições e todas negaram. Fui recebida com muita desconfiança... Pensavam que eu queria fazer política ou tirar algum benefício pessoal. Desisti. Agora pratico yoga todos os dias e busco ajudar meu próprio “eu”.<br /><br />Lembrei-me desse episódio ao chegar ao Ministério Público, onde teria audiência com alguns idosos ameaçados de despejo do prédio público em que desenvolvem atividades culturais há mais de 10 anos. São integrantes de associações informais que não recebem um centavo do poder público, mas oferecem atividades como dança de salão, capoeira, bumba-meu-boi, academia de ginástica etc. São 650 pessoas carentes que se beneficiam dos serviços ofertados gratuitamente.<br /><br />Os dirigentes foram pegos de surpresa pela cessão do espaço a um instituto que ambiciona congregar todos os idosos da cidade em seus domínios e, assim, fortalecer determinadas candidaturas ao parlamento alagoano. Coincidentemente, a beneficiária é uma ONG que já recebeu generosas contribuições dos cofres públicos sem participar de qualquer processo licitatório. As vítimas só tomaram conhecimento do despejo pelo Diário Oficial e estavam preocupadíssimas com o encerramento das atividades.<br /><br />Foi aí que percebi que a professora tinha razão. Está em curso um verdadeiro processo de apropriação dos hiposuficientes no Brasil. Velhinhos, crianças, adolescentes, portadores de deficiência, desempregados, todos são alvos de supostos defensores de sua dignidade. No fundo querem fazer um “belo” trabalho social regado a recursos públicos. Descobriram que a caridade pode se transformar num negócio muito lucrativo. Por isso não há espaço para o homem de bem que queira ajudar, movido exclusivamente por sentimentos altruístas.<br /><br />A caridade é defendida por todas as religiões que conheço. Muitos pensam que é um passaporte para o céu e um salvo-conduto para generosas benesses terrenas. O “político caridoso” usa os meios de comunicação para divulgar seus atos de benemerência com o objetivo angariar votos. Muitos votos. Para mim, a caridade tem de ser espontânea, desinteressada, discreta. Deve ser praticada sem alarde. É a maior expressão de compaixão e amor ao próximo. Alegra muito mais a quem dá do que a quem a recebe. Sua beleza está em saber que um pequeno gesto pode mudar a vida de seu semelhante.<br /><br />O problema é quando a caridade se torna uma obrigação. O prazer de ajudar ao próximo transforma-se em dívida que não admite atraso. Passa a ser compulsória e improrrogável. Em algumas ocasiões resolvi ajudar instituições religiosas ou caritativas que desenvolvem projetos sociais interessantes. Pouco a pouco as exigências financeiras aumentaram e os telefonemas de cobrança passaram a infernizar minha vida. Isso sem falar nas correspondências contendo mensagens subliminares para pressionar o incauto a “abrir o bolso”. Para atingir os objetivos, não poupam nada nem ninguém: imagens de santos, terços, água benta engarrafada e por aí vai...<br /><br />Certo dia bateu à minha porta um homem vestindo roupas rotas e um chapéu surrado. Sabia o meu nome e se dizia um grande admirador de minha atuação como promotor de justiça na comarca de Batalha ao longo dos anos 80. Disse-me que havia entrado no MST e que agora era um feliz proprietário de gleba num assentamento em Maragogi, região litorânea de Alagoas. Foi então que me entregou uma pequena cesta com produtos de sua roça: inhame, macaxeira, batata doce e algumas bananas. Disse-me que era um presente de admirador. Fiquei muito sensibilizado com o gesto de ofereci-lhe uma quantia em dinheiro como prova de meu agradecimento. Abraçamo-nos fraternalmente e nos despedimos.<br /><br />O mesmo gesto de “amizade” repetiu-se nas semanas seguintes, sempre com mesmo resultado, um dinheirinho para pagar a passagem e comer alguma coisa. Certa feita, dormi até mais tarde e não pude recebê-lo pessoalmente. Mas pedi que lhe entregassem uma quantia um pouco menor que a habitual. Ele recebeu o dinheiro mas se recusou a deixar o “presente”. Dias depois, tentava estacionar o meu carro na Aliança Francesa, quando vi que ele estava à espreita. Quem teria dado o meu endereço de trabalho? Fui logo dizendo que não queria a mercadoria. Ele retrucou com insolência que perdera o seu tempo me esperando e agora seria obrigado a voltar para casa de mãos abanando. Toda a doçura inicial se desvanecera. Agora era um homem violento, desapontado por não receber o dinheiro esperado. Vi que minha bondade inicial, espontânea, caritativa tinha se transformado num compromisso sucessivo e implacável. O prazer que sentia em ajudá-lo transformou-se num desagradável incômodo. Resultado: cortei o mal pela raiz.<br /><br />Esse episódio me fez lembrar um texto de Jean-Jacques Rousseau no livro Devaneios de um Caminhante Solitário. O filósofo defende a tese de que as boas ações são a expressão da liberdade do benfeitor. Devem ser sempre motivo de prazer, de alegria. Quando a caridade deixa de ser espontânea para sucumbir às pressões externas, torna-se uma dívida e perde toda a sua essência. Esvazia-se em si mesma.<br /><br />Acredito na solidariedade. Acho que cada cidadão tem a responsabilidade social de ajudar o seu semelhante. Penso que os brasileiros deveriam dedicar-se mais ao voluntariado e à ação humanitária. Essa é uma inegotável fonte de felicidade, que produz endorfina em abundância. Além disso, o engajamento nos movimentos sociais aprimora a democracia e fortalece o Estado de Direito. Entretanto, é preciso ter cuidado com os exploradores da boa-fé alheia, pessoas inescrupulosas que se aproveitam de sentimentos como o altruísmo para desenvolver atividades lucrativas nada compatíveis com os ideais religiosos ou éticos.<br /><br /><span style="color:#000099;">É preciso compreender que caridade não é obrigação, mas opção</span>. Caracteriza-se pela ausência de coerção externa. A decisão tem de ser espontânea, fruto da vontade consciente de ajudar o próximo com seu trabalho ou com seus bens, sem nada pedir em troca. Por isso é preciso ter cuidado para escapar das armadilhas baseadas na chantagem emocional, no medo do inferno, na insistência do pedido ou nos boletos de cobrança que todos os dias chegam às nossas casas. <span style="color:#000099;">Lembre-se, amigo: doador não é devedor, nem está sujeito a execuções judiciais ou divinas.</span> Se quer ajudar, basta seguir o chamado de seu coração. Você estará no caminho certo.</div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-87134934905892147502010-01-28T15:59:00.013-03:002010-01-29T09:03:18.829-03:00O QUE É AÇÃO HUMANITÁRIA?<div align="justify"><strong><span style="color:#006600;">GEORGE SARMENTO</span></strong></div><div align="justify"><strong><span style="color:#006600;"></span></strong></div><div align="justify"><span style="color:#000099;"></span></div><div align="justify"><span style="color:#000099;"></span></div><div align="justify"><span style="color:#000099;">A trajédia do Haiti já provocou cerca de 170 mil mortos e o número pode ser bem maior. Muitos se perguntam como um terremoto tão avassalador não foi previsto pelos cientistas, com seus aparelhos de alta tecnologia. Paradoxalmente, a catástrofe que destruiu um dos países mais pobres do Planeta também revelou milagres, como o da jovem que passou 17 dias sob os escombros e foi resgatada com vida.<br />A imprensa internacional tem analisado diversos aspectos do sofrimento haitiano e procurado explicar os efeitos perversos do colonialismo no país, vítima do isolamento internacional, da extrema pobreza e da pilhagem dos tiranetes corruptos. </span></div><div align="justify"><span style="color:#000099;">Os meios de comunicação destacam o papel de países como o Brasil e os Estados Unidos no socorro às vítimas e à manutenção da ordem. Entretanto tenho lido muito pouca coisa sobre a ação humanitária desenvolvida por entidades não-governamentais movidas pela solidariedade. </span></div><div align="left"><span style="color:#000099;">O enfoque humanitário da mídia se restringe ao papel dos boinas azuis, militares de várias nacionalidades vinculados às Nações Unidas, sob a coordenação do Brasil. O noticiário e as centenas de artigos publicados não se preocuparam em esclarecer o público sobre esse novo movimento de solidariedade que tem ajudado povos de todos os continentes a superarem suas dificuldades e a redescobrir a dignidade perdida. A visão reducionista prevalesse tanto na imprensa nacional como internacional. Foi aí que desencavei um artigo que escrevi a algum tempo sobre o papel da ação humanitária no âmbito das ONGS e da ONU.<br />Talvez seja um pouco longo, mas vale a pena conferir.<br /></span><br /><span style="font-size:130%;color:#990000;"><strong>AÇÃO HUMANITÁRIA: A NOVA FACE DA SOLIDARIEDADE</strong></span></div><div align="justify"><br />Em meados de 1859, Henri Dunant encontrava-se em Solferino, na Itália, em busca de uma audiência com Napoleão III. Foi quando testemunhou a carnificina que transformaria para sempre sua vida. A guerra entre França e Áustria atingira a sua fase mais violenta. As tropas inimigas combatiam sem trégua. Milhares de baixas desfalcavam os exércitos inimigos. Em apenas um dia, vinte e dois mil austríacos e dezessete mil franceses gravemente feridos em combate foram abandonados no campo de batalha.<br />Entregues à própria sorte, os soldados agonizavam ao relento sem qualquer esperança de salvação. Foi aí que aconteceu o inesperado. Os habitantes da região decidiram prestar socorro aos feridos sem levar em consideração o exército a que pertenciam. Indiferentes ao ódio que alimentava a guerra, modestos camponeses empenharam-se em aplacar o sofrimento dos mutilados e moribundos, assegurando-lhes cuidados médicos e conforto espiritual.<br />Na condição de cidadão suíço, Dunant participou ativamente dessa rústica operação de socorro. Acreditava que a ação de salvamento era um instrumento da vontade de Deus. Descobria a ideologia que passaria a comandar sua vida. Três anos depois do sangrento episódio, publicou Un Souvenir de Solferino, livro em que relata sua experiência como voluntário.<br />Movido pelo desejo de ajudar as vítimas da violência, Dunant funda, em 1863, o Comitê de Internacional de Socorro aos Militares Feridos, organização de natureza supra-estatal destinada a prestar ajuda humanitária nos campos de batalha. Mais tarde, a entidade é transformada em Comitê Internacional da Cruz Vermelha. O reconhecimento internacional não tardou a chegar: em 1901, Dunant recebe o Prêmio Nobel da Paz.<br />Hoje, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha é uma entidade não-governamental dedicada à difusão do Direito Humanitário Internacional. Sediada em Genebra, organiza missões médico-sanitárias em países vítimas da pobreza, da violência ou afetados por catástrofes naturais de grandes dimensões.<br />É indiscutível que a criação da Cruz Vermelha foi o grande marco da ação humanitária contemporânea. Mas não se pode afirmar que o humanitarismo começou com ela. Durante toda a Idade Média, a igreja católica promovia assistência aos pobres em forma de alimentos e esmolas. As grandes monarquias associavam-se à igreja para a distribuição de donativos, que geralmente ocorria em grandes ocasiões como a coração do rei, os casamentos e os funerais. Com a Revolução Francesa, o Estado passou a se preocupar com o destino das viúvas, esposas e órfãos dos soldados mortos ou mutilados em combate, instituindo os comitês de mendicância e construindo hospitais nas grandes cidades. Nessa época, surgem as sociedades filantrópicas, constituídas por famílias aristocráticas, que se consagravam à prática da beneficência.<br />A partir daí, as preocupações humanitárias se manifestaram de diversas formas, a exemplo da luta pela abolição da escravatura, pela melhoria da qualidade de vida, pelo respeito às minorias étnicas, sexuais e religiosas etc.<br />A ação humanitária tem orientação pacifista e luta pela preservação da vida humana em sua dignidade, socorrendo as vítimas dos desastres naturais, das crises econômicas, da violência política e da intolerância racial ou religiosa. Tem a missão de ajudar os povos a atravessar períodos de crise, amenizar as dores das vítimas dos conflitos armados, das grandes epidemias e das catástrofes naturais, através da distribuição de alimentos, remédios, agasalhos, vacinas e cuidados médicos.<br />A ação humanitária desconhece fronteiras. Sua dimensão é planetária, universal. O desejo de assegurar o direito à vida, ajudando o próximo a superar tragédias pessoais, é sua principal ideologia. A prática militante da fraternidade, o compromisso com a solidariedade entre os povos e o respeito ao direito internacional são outras vigas que sustentam o movimento.<br /><span style="color:#000099;">O humanitarismo não é um instrumento para a derrubada de governos despóticos ou de regimes ditatoriais</span>. A capacidade de escolha dos povos é respeitada em todas as circunstâncias. Seu foco é a organização de missões de socorro às vítimas da miséria, da fome e das epidemias. Sem qualquer outro propósito subjacente, visa a sobrevivência das populações que se encontram em profundo estado de fragilidade física e mental decorrente de brutal ruptura do equilíbrio anterior.<br /><span style="color:#000099;">O testemunho do drama é a principal estratégia de persuasão da opinião pública internacional.</span> As organizações não-governamentais precisam da imprensa não só para divulgar as ações humanitárias e angariar recursos, mas também para denunciar as atrocidades que põem em risco a vida das populações. Por outro lado, a imprensa utiliza a estrutura das equipes – aviões, caminhões e contatos locais – para ter acesso a regiões perigosas, quase sempre infestadas de guerrilheiros, moléstias ou exércitos hostis. Essa relação de interdependência tem funcionado muito bem, pois a presença de jornalistas no palco dos acontecimentos assegura transparência às missões de salvamento, inibindo qualquer possibilidade de manipulação da verdade.<br /><span style="color:#000099;">Embora não tenha interesses políticos nos países assistidos, a ação humanitária tem o dever de denunciar todas as formas de violência – crimes contra a humanidade, tortura, segregação racial ou religiosa, êxodos forçados, etc. – por que passam as populações civis</span>. Em 1985, foi criada a organização Repórteres sem Fronteiras que tem entre os seus objetivos o financiamento de reportagens sobre conflitos armados nos países esquecidos pelos meios de comunicação. Com sede em Paris, a entidade congrega colaboradores de várias nacionalidades que investigam violações aos direitos humanos, sobretudo os atentados à liberdade de expressão e o aprisionamento de jornalistas no exercício da profissão.<br /><span style="color:#000099;">A ação humanitária não tem vinculação com governos ou grupos políticos</span>. Isso não impede a construção de parcerias que garantam o acesso das equipes aos acampamentos com o exclusivo objetivo de auxiliar enfermos e feridos. Ocorre que as negociações nem sempre são fáceis. Há situações em que os governos locais desconfiam das reais intenções das organizações humanitárias. Outras vezes tentam utilizá-las a serviço de seus próprios interesses. O clima de tensão só é superado depois de exaustivas negociações em que os interessados fazem concessões mútuas, estabelecem prioridades e firmam acordos razoáveis.<br />A missão começa com a delimitação do corredor humanitário, que é o espaço territorial em que as equipes de salvamento podem atuar em segurança. Os voluntários fazem o levantamento das necessidades médicas e nutricionais mais urgentes, avaliam os riscos de doenças infecto-contagiosas, identificam os grupos mais vulneráveis e prestam os primeiros-socorros. Em seguida, montam acampamento, organizam um esquema de distribuição de agasalhos, alimentos, remédios e água potável. Iniciados os trabalhos, as equipes permanecem ao lado das vítimas até o total restabelecimento da autonomia perdida.<br />Muitas vezes os corredores humanitários são desrespeitados pelos exércitos, milícias e grupos religiosos radicais. Segundo dados da ONU de 1997, 57 países assistidos apresentam elevado risco de violência contra acampamentos, transportes e pessoal de apoio. Em outros 28, a insegurança mostra-se insuportável, obrigando a retirada da maioria dos voluntários de seu território. 150 funcionários da ONU foram assassinados em missão. Centenas de religiosos, ativistas e militares das tropas de paz foram vítimas de emboscadas, fuzilamentos ou execuções a sangue frio. Passados 10 anos, a situação não é diferente.<br />A onda de violência tem provocado fortes reações ao princípio da neutralidade tradicionalmente defendido pelo humanitarismo. Não que o movimento deva interferir nas decisões políticas dos países em conflito. Isto afrontaria a soberania das nações e a autodeterminação dos povos. Mas não se pode ficar indiferente às graves violações aos direitos humanos fundamentais. Por isso, muitos defendem a legitimidade da intervenção internacional em defesa dos princípios universais consagrados pelas convenções da ONU.<br /><span style="color:#000099;">Uma das grandes novidades do século XX é a militarização da ação humanitária</span>. Terminada a guerra no Golfo Pérsico em 1991, o Iraque, embora derrotado pelas forças aliadas, lançou ofensiva contra os curdos do norte, que foram obrigados a fugir para territórios turcos e iranianos. Foi então que o Conselho de Segurança da ONU, preocupado com a situação dos refugiados, exigiu do governo iraquiano o fim das hostilidades e o acesso imediato das organizações humanitárias ao local da tragédia. A Operação Provide Confort – como acabou ficando conhecida – inaugurou a ingerência humanitária, hoje considerada um sólido instituto de direito internacional.<br /><span style="color:#000099;">Embora as Nações Unidas não disponham de força militar permanente, seu Conselho de Segurança pode requisitar dos Estados-Membros tropas multinacionais e armamentos para operações de manutenção da paz</span>. Conhecidos como boinas azuis, os soldados portam o uniforme de seu país de origem e a insígnia das Nações Unidas. Levam consigo equipamentos ligeiros, que só podem ser utilizados em legítima defesa. Durante as operações, as tropas mantêm posição de neutralidade em relação aos países beligerantes ou aos grupos políticos envolvidos em movimentos revolucionários. Sua missão restringe-se a assegurar a ajuda humanitária, garantir a segurança das populações civis e promover negociações diplomáticas visando o cessar-fogo.<br />Do ponto de vista humanitário, as missões de observação e de manutenção da paz desenvolvidas pela ONU têm obtido resultados satisfatórios. Nos últimos anos, o mundo testemunhou intervenções de grande envergadura como a do Iraque, Bósnia, Somália e Ruanda e outras menores mas igualmente importantes, como a de Angola e Timor Leste, muitas das quais contaram com a colaboração das forças armadas brasileiras.<br />Ocorre, porém, que a intervenção militar com fins humanitários tem sido vista pelos militantes não-governamentais sob duas perspectivas: libertária e legitimista.<br />Acostumados à ação exclusiva das organizações não-governamentais no palco das tragédias, os libertários vêem com desconfiança a intervenção armada dos boinas azuis nos países devastados. Acreditam que o nivelamento com os Estados nas missões de assistência às populações civis atenta contra o princípio da independência do humanitário civil e colocam em risco a vida dos voluntários, freqüentemente confundidos com militares. Temem ainda que o movimento seja utilizado como um instrumento de defesa de interesses espúrios de potências mundiais nos territórios ocupados. Entendem, por fim, que a intervenção política e militar de grandes potências ou de coalizões internacionais sobre países acusados de graves violações aos direitos humanos não pode ser reconhecida como humanitária, mas política.<br />Outra corrente considera as missões da ONU legítimas desde que respeitem as normas de direito humanitário, assegurem o acesso das equipes de salvamento aos feridos, garantam a segurança dos acampamentos e restabeleçam os direitos humanos fundamentais violados por governos despóticos. Observados tais pressupostos, não haverá incompatibilidade legal ou ética que impeçam a atuação conjunta das entidades e das forças de paz.<br /><span style="color:#000099;">Em 1999, a organização Médicos sem Fronteiras é agraciada com o Prêmio Nobel da Paz</span>. Criada em 1971 com o objetivo de levar assistência médica às populações em perigo e testemunhar as tragédias e violações aos direitos humanos, estrutura-se como entidade humanitária sem fins lucrativos e nenhuma vinculação política, econômica ou religiosa. Mantida exclusivamente por donativos privados, é famosa pela eficiente prestação de assistência médica às vítimas de catástrofes de origem natural ou humana. O Comitê do Nobel reconheceu que seus voluntários são dotados de grande coragem, elevada dignidade e espírito de sacrifício, virtudes que são uma grande fonte de esperança para a paz e a reconciliação.<br />A premiação oxigenou a ação humanitária. A nova face do movimento procura unir assistência aos necessitados à denúncia das atrocidades. Embora represente um avanço em relação à neutralidade dos primeiros tempos, a nova postura ainda está longe de ser consensual. <span style="color:#000099;">Na verdade, a ação humanitária contemporânea encontra-se diante do seguinte dilema: escolher entre a compaixão e o engajamento político</span>. O resultado do embate entre essas duas tendências será decisivo para o futuro do movimento.<br /><span style="color:#000099;">Os mais conservadores sustentam a necessidade de permanecer fieis aos princípios éticos do humanitarismo – compaixão, voluntariado, não-ingerência, universalismo, assistencialismo, neutralidade, devotamento individual, conforto espiritual e luta pela sobrevivência das populações desfavorecidas<strong>.</strong></span> Acreditam na solidariedade desinteressada das organizações não-governamentais e nas ações humanitárias espontâneas que se manifestam diante acontecimentos catastróficos como enchentes, incêndios, epidemias, pobreza extrema, etc.<br /><span style="color:#000099;">Outros militantes, inconformados com as desigualdades sociais, reivindicam um mundo mais justo e igualitário. Cada vez mais distanciados da caridade e da filantropia, denunciam a exclusão, a miséria e a fome dos países periféricos</span>. Apóiam reivindicações de desempregados, famintos, desabrigados e camponeses sem terra. Mesmo nos países desenvolvidos, a preocupação com as pessoas em dificuldade tem apresentado um crescimento substancial. Na França, por exemplo, os Restaurantes do Coração, associação civil criada em 1985 pelo célebre humorista Coluche com o objetivo de alimentar os indigentes que vagam pelas ruas das cidades, gozam de grande popularidade. Importantes astros da música popular francesa fazem tournées gratuitas no país a fim de aumentar o número de voluntários e arrecadar fundos para a realização dos projetos da entidade.<br />O Brasil tem sido protagonista de muitas lutas humanitárias. Em 1993, o Movimento pela Ética na Política lançou a “Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida” com o objetivo de combater a fome, a pobreza e a exclusão social no país. Seu principal líder, o sociólogo Betinho, conseguiu mobilizar a sociedade civil para a distribuição de alimentos, vestimentas e abrigos, além de desenvolver projetos de educação para meninos de rua, assentamento de camponeses, hortas comunitárias, geração de emprego e renda, etc. Essa iniciativa quebrou o clima de indiferença da classe média em relação aos milhares de famintos que padecem dos males da injustiça social que assola a nação brasileira.<br />Mas não é só isso. <span style="color:#000099;">A onda humanitária também sensibiliza importantes segmentos empresariais</span>. O desejo de melhorar a imagem diante do mercado consumidor, a tentativa de restabelecer a crença dos empregados nas virtudes da empresa e o interesse em reforçar as relações entre pessoas envolvidas nos trabalhos de equipe são alguns dos objetivos a serem alcançados a partir dessa nova estratégia. A multinacional Danone, por exemplo, estimula seus executivos a participar de projetos educacionais destinados a alunos de primeiro grau. A Fundação Club Méditerranée promove sessões de cinema para os desabrigados e faz excussões noturnas pelas ruas de Paris para ajudar os mendigos. No Brasil, a Fundação Bradesco desenvolve projetos educacionais, visando educar e profissionalizar crianças e adolescentes pobres. Até mesmo estrelas do futebol e da música popular têm destinado parte de seus lucros para a promoção de projetos humanitários.<br />Não se pode dizer que essas iniciativas sejam absolutamente desinteressadas. Em muitos casos não passam de artifícios retóricos para encobrir contradições sociais. Verdadeiros paliativos à miséria, ao desemprego e a fome. Em outros, é clara a influência do marketing político, ávido por alavancar a imagem de clientes famosos. Isso sem falar daqueles que querem parecer magnânimos aos olhos da sociedade, posando de grandes beneméritos de um povo sofrido e injustiçado. Mas o que ninguém pode negar é que as novas vertentes humanitárias têm contribuído para aliviar o sofrimento das populações excluídas, restituindo-lhes um pouco da dignidade perdida.<br />Muitos consideram a ação humanitária excessivamente paternalista e imediatista. Argumentam que, antes de nutrir, agasalhar e medicar, é necessário preparar o homem para o exercício concreto da cidadania. De nada adianta alimentá-lo hoje, se amanhã ele irá defrontar-se com as mesmas condições de pobreza em que se encontrava anteriormente. <span style="color:#000099;">Na verdade, o humanitarismo não ambiciona governar as nações socorridas, tampouco implantar esta ou aquela ideologia política. O grande propósito é garantir o direito à vida, assegurando as condições mínimas de sobrevivência às populações em perigo</span>.<br />Qual a razão do sucesso da ação humanitária? O século 20 terminou melancolicamente. Já não se crê nas grandes utopias. Os partidos políticos estão em franca decadência: deixaram de ser a vanguarda das transformações sociais. O mercado parece ser o grande maestro da pós-modernidade. Diante dessa perspectiva pessimista, o humanitarismo surge como uma nova forma de cidadania. <span style="color:#000099;">As pessoas compreenderam que não podem cruzar os braços diante da intolerância, da exclusão social e da violência. E a prática dessa nova faceta da solidariedade talvez seja o melhor caminho de construir um mundo melhor.</span> </div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-44181133124653725362010-01-26T19:09:00.024-03:002012-10-24T23:50:48.449-03:00O QUE PODERIA TER SIDO SE...<div align="justify">
<span style="color: #000099;"><strong>GEORGE SARMENTO</strong></span><br />
A vida tem várias facetas envoltas em insondáveis mistérios. O ser humano é capaz de satisfazer-se com o que conquistou? Por que o vazio existencial insiste em nos atormentar depois que atingimos determinado objetivo? Será que precisamos de desafios permanentes e infinitos para nos sentirmos vivos? Tenho meditado muito sobre essas questões, mas não tenho resposta definitiva. Acho que nunca desvendarei essa trama.<br />
<br />
<span style="color: black;">Uma tese muito recorrente na obra poética de Mendonça Júnior é a de que <strong>os desejos que permanecem na dimensão dos sonhos são muito mais importantes que as realizações terrenas: <em>"Se o bem mais desejado, à mão, nos vem, ao estreitá-lo no peito, já todo o seu encanto está desfeito e nem parece mais o mesmo bem"</em></strong>. O soneto Velocípede<strong>,</strong> transcrito abaixo, é a metáfora das aspirações frustradas que se fixam na memória como possibilidade longínqua de felicidade. Elas existem para jamais serem satisfeitas, posto que habitam na <em><strong>dimensão do que poderia ter sido se</strong></em>....</span><br />
<span style="color: black;"></span><br />
<span style="color: black;">Parece que estamos condenados a viver eternamente incontentados, insatisfeitos com a vida real. O sonho inatingível é a grande utopia individual, o Jardim das Delícias, o Éden espiritual. Admiro muito as pessoas resignadas, perfeitamente satisfeitas e felizes com a concretude da realidade cotidiana. Talvez esse seja o caminho da serenidade, ou da "<strong>tranqüilidade da alma</strong>", como preferia Sêneca. </span></div>
<div align="justify">
<span style="color: black;"></span><br />
<span style="color: black;">Não sei se é maldição ou destino a incessante busca dos sonhos impossíveis. Acho que é por isso que tantas pessoas dedicaram suas vidas a procurar a Pedra Filosofal, a Fonte da Juventude, o Santo Graal, o Eldorado. Talvez seja essa a força que impulsiona a vida e impede a acomodação estagnante; talvez seja a expectativa de viver algo extraordinário, inusitado, fantástico. As pequenas conquistas do cotidiano alegram e alimentam a auto-estima. Elas são necessárias para fortalecer o espírito e me estimular a seguir em frente. O sentimento de frustação é derrotista, desanimador. Mas confesso, que os <em><strong>velocípedes cromados</strong></em> também povoam meus devaneios...</span></div>
<div align="justify">
<span style="color: black;"></span></div>
<div align="justify">
<br />
<br />
<strong><span style="color: black;">O VELOCÍPEDE</span></strong><br />
<span style="color: black;"></span><br />
<span style="color: black;"><strong>Mendonça Júnior</strong><br /></span><em><span style="color: black;">Ainda sinto que me falta<br />o lindo velocípede cromado<br />que foi a minha aspiração mais alta<br />e o meu primeiro sonho malogrado.<br /><br />Frequentemente, ante os meus olhos salta<br />esse brinquedo que me foi negado<br />e o menino de outrora ainda se exalta<br />e esbraveja, sentindo-se frustrado.<br /><br />Consola-me pensar que nehum bem,<br />depois de conquistado se mantém<br />ao nível em que pairou como esperança<br /><br />E só se guarda vivo na lembrança<br />Aquilo que se quer e não se tem,<br />o que mais se deseja e não se alcança.</span></em></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-62538962025692062862010-01-20T22:58:00.015-03:002010-01-23T00:27:59.280-03:00A FELICIDADE NO COTIDIANO<div align="justify"><span style="color:#000099;"><strong>GEORGE SARMENTO</strong></span></div><div align="justify">Em recente entrevista à Paris Match, Sebastian Marroquin, filho do sanguinário narcotraficante Pablo Escobar, Chefe Supremo do Cartel de Medelín, na Colômbia, falou do documentário intitulado <em><span style="color:#009900;"><strong>Os Pecados de Meu Pai</strong></span></em>, que será exibido em breve nos cinemas. Depois de viver muitos anos na Argentina, resolveu assumir sua verdadeira identidade, contar a história da família e pedir desculpas ao povo colombiano pelas atrocidades cometidas pelo pai.<br />Durante a perseguição implacável imposta a Escobar, Sebastian foi obrigado a viver trancafiado nas centenas de esconderijos escolhidos pelo Cartel de Medelín. O regime de "prisão domiciliar" durou cerca de 10 anos, consumindo toda sua infância. A agonia só acabou quando o narcotraficante foi encontrado pela polícia e morto após violenta troca de tiros em 1993.<br />Num dos trechos mais pungentes da entrevista, Sebastian relembra os dias de fome que passou quando se encontrava abrigado em casa de agricultores, nas imediações da cidade Medelín. Os policiais montaram uma barreira na frente do esconderijo e ali permaneceram durante uma semana, sem saber que os foragidos estavam tão perto. Pablo Escobar mantinha dois sacos contendo a quantia de 2 milhões de dólares em espécie. Mas com toda essa dinheirama, a família não podia comprar sequer um pedaço de pão.<br /><span style="color:#000099;"><strong>Esta situação paradoxal, obriga-nos a refletir sobre a dicotomia riqueza-liberdade</strong></span>. De que adianta sermos ricos, poderosos e temidos se não podemos gozar os prazeres simples da vida como ir à padaria do bairro ou visitar o melhor amigo? E ter milhões na conta bancária, mas viver sob permanente tensão já que a fortuna foi obtida ilicitamente? Vale a pena tanto apego às coisas materiais se somos obrigados a abdicar dos prazeres mais singelos como chupar um picolé, comer pipoca na praça ou sentar nas areias da praia para contemplar um belo pôr do sol? Sei que estou entrando em terreno perigoso, pois essas questões são universais e foram discutidas pelos grandes filósofos desde a Antiguidade.<br />Em meu ofício de promotor de justiça, vejo a vida de tantos jovens se despedaçar ao entrar no mundo do crime! Mortes prematuras, inocência perdida, infância fanada, famílias despedaçadas... Em troca de quê? De um celular de luxo, roupas de grife, algum dinheiro e a vida abreviada por uma execução sumária. Outros que tinham tudo, mas que desperdiçam suas carreiras ao chafurdar na corrupção. Essas decisões equivocadas e destrutivas sempre me intrigaram. Nunca consegui compreender por que tantas pessoas jogam na lama uma reputação que consumiram anos a construir.<br />Nada tenho contra a riqueza construída com o suor do trabalho ou legitimada por herança, laços de matrimônio e outras formas legais. Se a pessoa acha que a acumulação de bens materiais a fará feliz, é natural que percorra esse caminho. Se procurar usar parte do dinheiro para investir em ações de solidariedade, tanto melhor. Mas o que importa aqui é analisar o estado de espírito de quem enriqueceu ilicitamente e agora vive sob a permanente tensão de ser obrigado a prestar contas à Justiça, ou pior, à Polícia Federal.<br /><span style="color:#000099;"><strong>Acredito que a maior dádiva do ser humano é a paz de espírito, esse estado emocional em que tudo conspira para a serenidade, calma e harmonia interior.</strong></span> Não pretendo discutir os caminhos que levam à felicidade. Falta-me arte e engenho para tanto. Tampouco quero me transformar em autor de auto-ajuda. Meu objetivo é fazer uma rápida incursão na filosofia para tentar responder as perguntas aqui formuladas.<br />Socorro-me de Sêneca, um dos mais importantes estóicos da Antiguidade, que foi preceptor de Nero (aquele mesmo que ateou fogo em Roma). A base teórica dos seus ensinamentos consistia na idéia de que o homem deveria viver de acordo com sua natureza, adaptando-se a todas as situações com que se deparasse, mesmo as mais adversas.<br />Sêneca escreveu um discurso intitulado <em>Da Tranquilidade da Alma</em>, em que apresenta preciosos conselhos para quem deseja paz de espírito. Prega o desapego às coisas materiais em troca da riqueza interior. Para ele o melhor critério para lidar com o dinheiro consiste em não cair na pobreza nem dela afastar-se completamente. A riqueza é vista como uma permanente fonte de infortúnios e desgraças, a menos que os bens sejam usados para ajudar ao próximo: “onde houver um ser humano, aí haverá a possibilidade de se fazer o bem”.<br />Para ele <strong><span style="color:#000099;">a harmonia da alma é o bem supremo</span></strong>. Pregava a necessidade de uma vida retirada, consagrada às coisas do espírito, longe dos prazeres que escravizam a mente e tolhe a liberdade. Defendia que é preciso cultivar o comedimento, a refrear a luxúria, a moderar a ânsia de glória, a suavizar a ira, a olhar com simpatia a pobreza, a cultivar a frugalidade. Enfim, a felicidade consistia em uma vida virtuosa em que nossos atos refletissem fielmente os valores éticos em que acreditamos.</div><div align="justify"></div><div align="justify">O iluminismo prometeu que a felicidade estaria na vitória da razão sobre a supertição. Apenas o progresso científico e material seria capaz de assegurar a tranquilidade da alma ao maior número de pessoas. O <span style="color:#006600;"><strong>droit au bonheur </strong></span>(direito à felicidade) está estampado na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789. A felicidade geral era a maior aspiração do Utilitarismo inglês, na pluma de Jeremy Bentham. Infelizmente as promessas não foram cumpridas e terminamos voltando à estaca zero, com as mesmas perguntas e perplexidades.<br /><strong><span style="color:#000099;">Tenho a convicção que toda a fonte da infelicidade consiste no descompasso entre as ações cotidianas e as nossas crenças mais íntimas</span></strong>. Isso acontece sempre quando a vida que levamos não reflete os que acreditamos. Ser infeliz é ter consciência da contradição entre o pensar e o agir, o que gera um estado de desarmonia interior profundamente nocivo à saúde. O sentimento de incongruência avança quando insistimos nos equívocos à espera que aconteça algum milagre.<br />É evidente que a felicidade tem o seu lado objetivo, externo. Ninguém é feliz quando está privado das condições mínimas de existência digna, quando os seus direitos fundamentais são sistematicamente violados pelo Estado ou pela sociedade. A satisfação das necessidades básicas e o exercício da cidadania são pressupostos obrigatórios para o bem-estar do corpo e da mente. Mas também não podemos afirmar que a abundância de bens materiais seja um passaporte para a felicidade. Estudos desenvolvidos por cientistas sérios provam que a maioria dos ricos entrevistados se sentem infelizes, embora não sofram privações de suas necessidades básicas.<br />A sociedade de consumo está calcada na superficialidade, no efêmero, na ausência de vínculos duráveis. Esse modelo estimula a inveja, a hipocrisia, o supérfluo, o imediatismo e tantos outros sentimentos negativos que envenenam a alma. A indústria famacêutica tenta explorar o vazio existencial criando a pílula da felicidade, apontada como a descoberta do século. Muitos escolhem o caminho do crime como o atalho para a construção de riquezas monumentais. <strong><span style="color:#000099;">Mas a</span><span style="color:#333399;"><span style="color:#000099;"> </span>verdadeira felicidade só é possível como experiência subjetiva a partir da consciência de que os nossos atos refletem precisamente o que acreditamos, as nossas mais profundas e verdadeiras convicções.</span></strong> </div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-43934075020388297582010-01-14T22:05:00.010-03:002010-01-16T10:56:16.045-03:00SOBRE A ARTE DE FLANAR<div align="justify"><strong><span style="color:#000099;">GEORGE SARMENTO</span></strong></div><div align="justify">Quando me perguntam se pratico esportes regularmente, respondo: caminhadas. Ainda criança, costumava passar as manhãs no Clube Fênix Alagoana onde jogava voleibol, futebol e outros esportes coletivos. Na rua em que morava, no bairro do Farol, havia campinhos improvisados que eram palcos dos populares “rachas” reunindo meninos da redondeza, ricos e pobres, sem discriminações. O abismo social ainda não nos tinha sido apresentado pela sociedade capitalista.<br /><br />Já adulto, os amigos foram se dispersando e os encontros escassearam-se até desaparecerem completamente. Alguns mergulharam nos intermináveis compromissos do casamento, outros engordaram, muitos sucumbiram ao sedentarismo, sem falar daqueles que simplesmente sumiram sem deixar vestígios de suas histórias de vida.<br /><br />Foi então que comecei a praticar esportes individuais, sobretudo caminhadas diárias à beira mar. Nunca fui muito resistente a corridas, embora hoje tenha mais fôlego do que antes – o que para mim é mais um mistério insondável da existência humana. Eu tinha 24 anos, era promotor de justiça e havia construído um simpático chalé na praia de Guaxuma. Estava em pleno gozo das prerrogativas que a liberdade e a independência financeira podiam propiciar a uma pessoa de minha idade. E adorava caminhar... Pés descalços na areia macia, vento acariciando os cabelos e a contemplação da paisagem marinha.<br /><br />Nunca caminhei para emagrecer, tonificar os músculos, fortalecer as funções cardíacas ou aumentar os meus dias de vida no Planeta Terra. As caminhadas serviram muito mais para exercitar o cérebro do que o corpo. As melhores idéias que tive se revelaram no curso de uma boa caminhada. A solução de muitos problemas existenciais, profissionais e financeiros aconteceu nas mesmas circunstâncias. São momentos mágicos em que entramos em perfeita sintonia com a natureza.<br /><br />Retifico o que disse acima. Andar não é um esporte, mas um estilo de vida. Tem gente que anda para não ter um enfarte, para se entorpecer de endorfina ou para conter a agressividade. O que faço é diferente. Aproxima-se muito do que denominamos flanar, isto é, caminhar sozinho, sem rumo, observando calmamente a paisagem urbana ou rural (no meu caso, marinha), com a mente livre e o corpo relaxado.<br /><br /><strong><span style="color:#000099;">O flâneur</span></strong> foi eternizado pelo poeta francês Charles Baudelaire no ensaio intitulado <em>O Pintor da Vida Moderna</em>, publicado no Século XIX. Personagem tipicamente parisiense, o <span style="color:#000000;">flâneur</span> é descrito como um caminhante anônimo que observa apaixonadamente o espetáculo da vida, que recolhe impressões do cotidiano e as eterniza no papel quando ainda se encontram bem vivas em sua memória. Graças a ele, foram criados os bulevares, os jardins, os passeios públicos, lugares onde a paisagem “feita de gente viva” se mistura ao esplendor das árvores e flores. Mesmo no Brasil contemporâneo, áreas urbanas são especialmente projetadas para os praticantes de caminhadas. São espaços frequentados por pessoas de todas as idades, com os mais diversos interesses.<br /><br />A França produziu flâneurs como Diderot, Voltaire e Balzac, escritor que recolhia das ruas a maioria dos personagens de seus romances e conseguiu traçar um dos mais fiéis retratos da sociedade de sua época. Recentemente li <em>Os Devaneios de um Caminhante Solitário</em>, o último livro escrito por Jean-Jacques Rousseau. Seu objetivo era descrever o estado habitual da alma durante as caminhadas solitárias pelos arredores de Paris. O método é simples: <strong><span style="color:#cc0000;">manter a mente livre por inteiro para que as idéias e devaneios sigam suas inclinações, sem resistência e sem dificuldade</span></strong>.<br /><br />O filósofo chegou a declarar que “<span style="color:#000099;">essas horas de solidão e de meditação são as únicas do dia em que eu sou eu mesmo por inteiro e pertenço a mim sem distração, sem obstáculo, e em que posso dizer de verdade que sou o que a natureza quis</span>”. A obra de Rousseau inaugura uma nova <span style="color:#cc0000;"><strong>estética do caminhar como autoconhecimento</strong></span>, sendo precursora de peregrinações como o Caminho de Compostela e a escalada de Machu Picchu.<br /><br />Em seu livro <em>Meditar Caminhando</em>, Thich Nhat Hahn, um monge vietinamita exilado na França, também fala dos benefícios psíquicos e físicos das caminhadas lentas, contemplativas, plenas de pensamentos positivos e exercícios respiratórios. Já testemunhei seguidores do líder budista aplicar suas técnicas em passeios pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro, com resultados maravilhosos para a saúde.<br /><br />Vivemos num mundo dominado pelo pragmatismo. As pessoas estão ávidas para consumir poções mágicas de vitalidade. Prolongar a juventude, manter-se atraente, gozar de saúde são aspirações legítimas e podem ser perseguidas com avidez por aqueles que aspiram melhorias em sua qualidade de vida. Pergunto: para que as esteiras mecânicas se o mundo está ao alcance de todos? As caminhadas não são meros instrumentos de fortalecimento do corpo físico. <span style="color:#000099;"><strong>O movimento pelo movimento de nada vale se não estimular a inteligência</strong></span>. A lição que nos deixa a arte de flanar é que as caminhadas são prazeres democráticos e benéficos tanto para o corpo como para a alma. E,ainda por cima, não custam nada!</div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-22391986964579992952010-01-14T00:01:00.009-03:002010-01-16T20:11:11.460-03:00COTIDIANO EM MOVIMENTO<div align="justify"><em><span style="color:#000099;"><strong>GEORGE SARMENTO</strong></span></em></div><div align="justify"><em></em></div><div align="justify"><em>Cotidiano</em>, de Chico Buarque de Holanda, é um clássico da música popular brasileira que fez muito sucesso nos anos 70 pela mensagem subliminar de inconformismo com a sufocante rotina de alguns casais. A narrativa não poderia ser mais clara: “todo dia ela faz tudo sempre igual”. E por aí segue com a descrição dos atos repetitivos, previsíveis e entediantes de sua mulher. O paradoxal é que o tédio do personagem não é provocado pela indiferença da fêmea, mas por um conjunto de manifestações de afeto que ela lhe dirige, possivelmente para manter acesa a chama do amor.<br />Quase sempre a palavra <strong><span style="color:#990000;">cotidiano</span></strong> tem uma conotação negativa, estagnante. Geralmente é usada para descrever a acomodação das pessoas a hábitos adquiridos pela repetição mecânica ou inconsciente. Funciona como o escudo protetor daqueles que não querem deixar a zona de conforto para enfrentar os riscos de uma jornada incerta e inusitada. Representa o lado estático da existência humana, a sensação de segurança que experimentamos ao percorrer caminhos conhecidos que nos levam ao destino esperado, sem surpresas ou sobressaltos.<br />Há pessoas que não quebram sua rotina por nada nesse mundo. Traçam uma rota para as suas existências e se recusam a tomar atalhos, arriscar novas trilhas, mergulhar no desconhecido. Qualquer desvio é motivo para inseguranças, temores, pânico. Acreditam ser possível proteger-se das incertezas cada vez mais presentes na sociedade contemporânea, tão complexa e fluida. São vagões que jamais saem dos trilhos.<br />Muitas vezes é preciso que um acontecimento trágico nos desperte para a beleza da vida. Para as experiências maravilhosas que podemos experimentar se tivermos coragem de mudar de atitude, de vermos as coisas sob outra perspectiva. Somos obrigados a conviver com perdas. Essa é a lei da existência. Minha mãe partiu prematuramente aos 50 anos de idade, vítima de um derrame cerebral fulminante, deixando para trás os filhos, a música e a literatura que tanto amava. Meu pai foi arrancado da vida por um acidente automobilístico brutal, no auge de sua carreira profissional – ainda cheio de sonhos e energia. Agora mesmo meu tio Mendonça Neto luta bravamente contra um câncer com a mesma coragem com que combateu a corrupção e os desmandos de uma elite parasita que há séculos dilapida impiedosamente o Estado de Alagoas. </div><div align="justify"></div><div align="justify">Nenhum desses acontecimentos poderia ser previsto por mim ou por quem quer que seja. O importante é que essas fatalidades não me tornaram um pessimista, invejoso ou descrente. Antes um otimista, como o Cândido, de Voltaire. Sou uma pessoa comum. Tenho virtudes e defeitos. Mas a cada dia reforça em mim a convicção de que é preciso evoluir moral e espiritualmente. Luto muito contra a dificuldade de dizer não, o injustificado sentimento de culpa e o altruismo exagerado que insiste em reconhecer o direito dos outros em detrimento dos meus. Enfim, nada que não possa ser superado através de reflexões racionais e objetivas.<br />Há pessoas que simplesmente são incapazes de resistir às frustrações de expectativas. Não percebem que a vida tem várias portas e muitas delas podem nos trazer felicidade. Simplesmente não sabem lidar com a transitoriedade das coisas. Apegam-se a ilusões como o poder, a bajulação, os bens materiais, a notoriedade, mas não se preparam para as adversidades que todas as mudanças proporcionam. Não sabem enfrentar o ostracismo, a solidão, o esquecimento e a ingratidão. Fujo desse estigma e me recuso a assumir a condição de vítima de quem quer que seja.<br />Em pleno século XIX, Baudelaire já afirmava que a <strong><span style="color:#990000;">modernidade é o transitório, o efêmero e o contigente</span></strong>. Nada é permanente, sólido, imutável. A vida não pode se cristalizar em hábitos que produzem a falsa sensação de segurança. As nossas certezas viraram pó. O que hoje é novidade, amanhã será obsoleto. Os castelos inespugnáveis podem se transformar num amontoado de grãos de areia.</div><div align="justify">Eis o que eu queria dizer: <span style="color:#990000;"><strong>O COTIDIANO TEM DE ESTAR EM PERMANENTE MOVIMENTO!</strong></span> Nada impede que a rotina modorrenta possa se transformar na exploração do novo, do desconhecido e do belo. Como adotar um novo paradigma para as nossas vidas? Uma amiga muito querida costuma dizer que “a criatividade é infinita”. Ela tem razão. Não há respostas prontas. Cada um tem o seu ritmo e intuição, a voz interior que insiste em nos lançar no labirinto desse mistério que se chama vida. </div><div align="justify">Feliz 2010!</div>GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-17203413891733076502009-12-14T21:48:00.003-03:002009-12-16T00:57:47.384-03:00A BELA<!--StartFragment--> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> </span>Certamente, alguns de vocês haverão de lembrar quando neste espaço, relatei um particular caso que envolvia um erudito amigo; amante e praticante<span style="mso-spacerun: yes"> </span>do mais puro materialismo dialético.<span style="mso-spacerun: yes"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Naquela oportunidade ele, com a mais absoluta segurança,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>afirmava <span style="mso-spacerun: yes"> </span>ser o conceito de beleza abstrato e relativo. Da mesma forma, defendia ardentemente que o amor romântico era<span style="mso-spacerun: yes"> </span>mera criação dos trovadores e cavaleiros da Idade Média, impossível de existir no atual mundo pragmático e tecnológico. Tal quimera,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>só seria<span style="mso-spacerun: yes"> </span>possível<span style="mso-spacerun: yes"> </span>nas fantasiosas mentes das românticas amantes de telenovelas e leitoras de <i style="mso-bidi-font-style: normal">Sabrina.</i></span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Todos lembram-se, do mesmo modo, quando, em determinada quadra, fui surpreendido com a inesperada mudança de opinião do amigo a respeito das pétreas teses que defendia.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Operou-se a surpreendente mudança quando ele, trêmulo e embevecido com a inesperada visão que tivera, não lembro bem, se numa moderna academia, se numa aula de natação ou até mesmo numa procissão , me confessou como uma criança diante de seu primeiro brinquedo que retirava todos os argumentos assacados contra a existência da beleza e reconhecia, sem<span style="mso-spacerun: yes"> </span>qualquer pudor erudito, <span style="mso-spacerun: yes"> </span>sua concretude, pois a vira <span style="mso-spacerun: yes"> </span>personificada ali<span style="mso-spacerun: yes"> </span>naquela<span style="mso-spacerun: yes"> </span>figura transcendental.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Tal visão,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>fizera seu outrora frio e matemático ponto de vista, ruir como um sorvete ao sol.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span>Tão aparvalhado estava o amigo naquele instante, que sequer tive<span style="mso-spacerun: yes"> </span>a iniciativa de<span style="mso-spacerun: yes"> </span>solicitar a descrição da criatura causadora de tal estrago.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>O meu espanto<span style="mso-spacerun: yes"> </span>com semelhante mudança me fez<span style="mso-spacerun: yes"> </span>olvidar a instintiva e natural curiosidade sobre aquele ser encantador, causador da impressionante hecatombe naquele<span style="mso-spacerun: yes"> </span>convicto materialista.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Ali mesmo, lembro bem, mergulhei em ilações um tanto quanto frias e analíticas, na tentativa de descobrir o que levara o amigo àquela infeliz condição. Rapidamente passaram por minha cabeça análises que sempre estávamos acostumados a<span style="mso-spacerun: yes"> </span>fazer antes daquele pobre ser entrar em surto.<span style="mso-spacerun: yes"> </span></span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span>Ocorre-me agora a lembrança: Ao tempo de sua sanidade mental, uma das principais teses abordadas por nós,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>era sobre o recorrente tema do domínio que a natureza<span style="mso-spacerun: yes"> </span>exerce sobre suas criaturas e, principalmente,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>sobre a armadilha que ela nos joga, no seu desiderato de perpetuar a espécie e repassar nossa carga genética.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Do alto daqulea pretensa erudição, assim como de nossa suposta segurança antropológica, sempre nos julgamos imunes aos<span style="mso-spacerun: yes"> </span>laços de tal armadilha.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Pacífico,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>era o entendimento de que a natureza, quando pretende dar seguimento à espécie, atira à suas vítimas um feitiço que faz com que cada um dos sexos veja no outro, atributos e qualidades que se encontram muito além de um ponto de vista sensato, lhes<span style="mso-spacerun: yes"> </span>aguçando e exagerando todos os sentidos e revolvendo em seu interior,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>forças nunca antes imaginadas.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Vejam o salmão!<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Nada exaustivamente até a cabeceira do rio em que um dia nasceu para, uma vez lá, cumprir seu último e mortal ritual de acasalamento. O macho da viúva negra que dá a vida por uma cópula. O Louva -Deus, decapitado pelo mesmo objetivo.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Da mesma forma, homem ou mulher, quando elegem um parceiro que o instinto determinou para<span style="mso-spacerun: yes"> </span>o repasse de sua carga genética, de nada adianta apelos de<span style="mso-spacerun: yes"> </span>familiares ou amigos,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>demonstrando ser aquele parceiro um perfeito canalha e que aquela escolha é um desastrado erro do ponto de vista das relações sociais e humanas.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Não há quem os demova.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>No ser humano, o alvo da natureza é aquilo<span style="mso-spacerun: yes"> </span>que julgamos nosso atributo superior, a razão.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Assim, nessa tocaia natural, ela é a primeira baixa.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Em consequência, torna-se o homem<span style="mso-spacerun: yes"> </span>patético e ridículo,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>tamanhas as forças da transformação que nele se opera.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Em sua trama, a natureza envia ao cerébro de cada um dos enredados personagens,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>comandos<span style="mso-spacerun: yes"> </span>que os levam a superestimar qualquer traço ou atributo físico existente no outro. Um pequeno traço no rosto torna-se<span style="mso-spacerun: yes"> </span>um obelisco de beleza; um determinado jeito de olhar torna-se um encanto; uma palavra que, lançada em normal contexto,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>soaria tola e enfadonha, para o enamorado soa como um Cântico de Salomão. Enfim, como diria o poeta, tudo torna-se divino e maravilhoso, uma vez a vítima tenha sido tocada pelo inebriante efeito da <i style="mso-bidi-font-style:normal">Mágica<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Poção.</i></span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span>Discutíamos isto e nunca desconfiei<span style="mso-spacerun: yes"> </span>que nosso seguro e impassível amigo<span style="mso-spacerun: yes"> </span>viesse<span style="mso-spacerun: yes"> </span>ser um dia,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>vítima de tal feitiço.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> </span>Mas…,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>apenas pretendo<span style="mso-spacerun: yes"> </span>dizer<span style="mso-spacerun: yes"> </span><span style="mso-spacerun: yes"> </span>que,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>diante de um perfeito e acabado exemplo confirmatório da existência de tais forças, não tive, naquele momento, presença de espírito para colher do agora romântico <i style="mso-bidi-font-style:normal">Zumbi</i> ,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>uma descrição detalhada da criatura que lhe havia<span style="mso-spacerun: yes"> </span>turbado a razão daquela maneira.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:36.0pt"><span lang="EN-US"><span style="mso-spacerun: yes"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span>Dias depois encontro-o<span style="mso-spacerun: yes"> </span>em<span style="mso-spacerun: yes"> </span>transe<span style="mso-spacerun: yes"> </span>de menor voltagem,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>mas ainda enebriado pelo traiçoeiro golpe desferido pela natural <i style="mso-bidi-font-style:normal">Circe</i> e então<span style="mso-spacerun: yes"> </span>finalmente<span style="mso-spacerun: yes"> </span>peço-lhe em tom de gozação:</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:36.0pt"><span lang="EN-US"><span style="mso-spacerun: yes"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span>- Amigo,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>descreva-me a<span style="mso-spacerun: yes"> </span>tal<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Vênus que lhe transtornou.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:36.0pt"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span>E ele, com olhos faiscantes de encantamento, mente atravancada de sonhos, boca atulhada de elogiosas palavras,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>começou:<span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span></span></p><p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:36.0pt"><span lang="EN-US"><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"></span> - Pra começo, é pernóstica!! Pernóstica sim,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>muito pernóstica!!!</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> Eu pasmo.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>- Pernóstica ?<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Como assim<span style="mso-spacerun: yes"> </span>pernóstica ?<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Se o deixou maluco !</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"></span><span style="mso-tab-count:1"></span><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> <span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> E ele, tentando se fazer entender:</span></p><p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> - Explico amigo. Não é pernóstica no sentido usual. Digo que é<span style="mso-spacerun: yes"> </span>pernóstica pelas belas e longilíneas pernas que possui.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Precisa ver!!!<span style="mso-spacerun: yes"> </span>(Disse com olhos injetados )<span style="mso-spacerun: yes"> </span>-Duas colunas do mais belo e puro mármore de Carrara.</span></p><p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span class="Apple-tab-span" style="white-space:pre"> </span> Sentindo o bem que tais forças telúricas<span style="mso-spacerun: yes"> </span>estavam provocando<span style="mso-spacerun: yes"> </span>no humor do pobre amigo insisti,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>reconheço, com uma pequena dose de malvadeza, em obter maiores detalhes só pra ver até onde<span style="mso-spacerun: yes"> </span>ia aquela alucinação.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">Fustiguei-o, <span style="mso-spacerun: yes"> </span>tal qual um curioso padre no<span style="mso-spacerun: yes"> </span>confessionário.<span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>– E aí…<span style="mso-spacerun: yes"> </span>e aí, o que tem mais?</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">Com medo de ser traído por suas confidências, o amigo deu uma discreta olhadinha em volta, enrubesceu as bochechas, estufou o peito e continuou.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">- Aquele rosto… Ah…<span style="mso-spacerun: yes"> </span>que rosto!!<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Os traços são de uma legítima beleza helênica.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Seu perfil parece saido de uma ânfora grega.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Tem boca de suculento morango e olhos de<i style="mso-bidi-font-style: normal"> Capitu</i>. Os cabelos, longos e sedosos, pendem de sua cabeça<span style="mso-spacerun: yes"> </span>e, como uma negra cascata,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>ganham os contornos dos ombros,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>descem novamente lisos até misturar suas finas pontas aos dourados pelos lombares.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Findam-se pendurados num doce bailado perto daqueles dois furinhos,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>resquícios da criação Divina; quando ao concluir sua obra prima, Deus<span style="mso-spacerun: yes"> </span>deu-lhe um empurrãozinho<span style="mso-spacerun: yes"> </span>com dois dedos na região lombar,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>dizendo:<span style="mso-spacerun: yes"> </span>“ Te chamarei mulher…<span style="mso-spacerun: yes"> </span>agora vai…<span style="mso-spacerun: yes"> </span>vai levar a loucura ao inocente e incauto Adão .”<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Restando daquela ação, apenas as duas marquinhas que, até hoje,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>a todos encantam.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">Ao notar que o amigo estava quase em estado hipnótico,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>tal qual o <i style="mso-bidi-font-style: normal">Professor Aquiles Arquelau</i>, aquele incorrigível apaixonado por Bruna Lombardi, fiz de um pigarro a campainha para o trazer<span style="mso-spacerun: yes"> </span>de volta à realidade. Então ele estremeceu e continuou:</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">-Desculpe-me, quase me perdi em devaneios heréticos e eróticos, mas…, prosseguindo:<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Mãos e pés são talhados com uma finura de causar admiração a um Michelângelo. <span style="mso-spacerun: yes"> </span>Aliás, por falar nisto, este ficaria pasmo com a perfeição das proporções que reinam no corpo daquela criatura. O amigo sabe muito bem que o segredo da beleza está nas proporções das medidas.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Não é ??</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US"><span style="mso-spacerun: yes"> </span>Sempre concordamos sobre a existência das medidas denominadas medidas de ouro, ou<span style="mso-spacerun: yes"> </span>melhor dizendo, <i style="mso-bidi-font-style: normal">proporção áurea</i>, encontrada na natureza e reproduzida pelos gênios em várias de suas criações artísticas como no <i style="mso-bidi-font-style: normal">Parthenon</i> na acrópole grega, no<span style="mso-spacerun: yes"> </span><i style="mso-bidi-font-style:normal">Nascimento de Vênus</i>, de Botticelli e em muitas<span style="mso-spacerun: yes"> </span>outras<span style="mso-spacerun: yes"> </span>geniais criações humanas. <span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>- Pois é amigo, lhe asseguro; a bela possui, sem sombra de dúvidas, tais medidas. Seu corpo é uma perfeição de proporções. Nada<span style="mso-spacerun: yes"> </span>ali foi posto demais,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>nada<span style="mso-spacerun: yes"> </span>ali<span style="mso-spacerun: yes"> </span>revela-se de menos. Prosseguiu ele em seu transe, até notar que, de fininho, eu saíra deixando-o a falar sozinho.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">Diante daquela quase lunática ode à beleza, pensei comigo: “Realmente o lastimável estado em que se encontra o amigo é uma prova acabada daquilo que tanto havíamos observado nos outros. Seu transe demonstra as indomáveis forças da natureza agindo nos genes da pobre criatura. Ele não é mais ele, é um reles fantoche que<span style="mso-spacerun: yes"> </span>a natureza está usando para se reproduzir.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Não importam as consequências mundanas que lhe advirão, o importante ali é o secreto desejo do gene egoísta que pretende se replicar.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Tomara Deus,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>passe logo tal feitiço”.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">Apavorado com tamanha transformação e regressão do amigo, só tive tempo de lembrar e observar como, a natureza e o tempo, com suas forças e necessidades, fazem o arco da vida quase tocar suas extremidades.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US">O que eu vira ali,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>era o vigor e o entusiasmo que existiram um dia no jovem, ressurgindo<span style="mso-spacerun: yes"> </span>naquele<span style="mso-spacerun: yes"> </span><i style="mso-bidi-font-style:normal">Casmurro</i> senhor<span style="mso-spacerun: yes"> </span>com a mesma força e viço descomunal de antes,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>numa demonstração de que somos meros instrumentos de uma ordem ou lei natural, interessada apenas no seu próprio script, o qual tem seu objetivo voltado apenas para a perpetuação do gene e da espécie. Enquanto que, como<span style="mso-spacerun: yes"> </span>seres individuais, somos tristemente ignorados,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>descartáveis e pseudos senhores do nosso destino.</span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify;text-indent:72.0pt"><span lang="EN-US"><o:p> </o:p></span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span lang="EN-US"><span style="mso-tab-count:1"> </span>Isaac Sandes <span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>14/12/2009.</span></p> <!--EndFragment-->GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-90731196134529064522009-12-04T20:58:00.004-03:002016-06-17T07:56:19.457-03:00DOS HOMENS, PÉS E SAPATOS<div style="text-align: justify;">
<span class="Apple-style-span" style="font-weight: bold;">Isaac Sandes</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<b><br /></b></div>
<div>
<b> <!--StartFragment--> </b><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">O</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">recorrente e surdo combate existente entre</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">jovens e</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">velhos,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">pertecentes às mais diversas instituições e segmentos, quer sejam de</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">trabalho, de lazer ou política, me obrigou à seguinte reflexão:</span></span></b></div>
<b> <div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">A humanidade e os indivíduos, os pés e os sapatos,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">guardam entre si, muita semelhaça no</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">contexto da jornada humana.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Como os sapatos os indivíduos podem ser novos ou velhos.</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Como os pés, a sociedade pode ser calejada ou imatura.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Todos guardam entre si, uma relação de simbiose e completude, onde suas importâncias e necessidades</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">mútuas deverão ser respeitadas,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">jamais buscando</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">prescindir uns dos outros para o sucesso da caminhada comum.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Quando os jovens são inundados pelas forças dos hormônios, costumam dar azo a um velho discurso de gerações passadas, o qual prega estar o velho</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">ultrapassado para o ingente</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">esforço social. </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Por seu lado, ao</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">sentirem a sorrateira chegada da</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">velhice, os homens maduros vão entoando uma catililnária</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">que, da mesma forma, prega o despreparo do jovem para posições de destaque no contexto social.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Todos se acusam e se esforçam em demonstrar as deficiências uns dos outros,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">e esquecem</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">de</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">dirigir um simples olhar para o</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">sábio exemplo que nos é dado pelo uso de nossos</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">sapatos e </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">pelas aptidões de nossos pés.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Com os sapatos aprendemos que, para</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">o sucesso de uma caminhada longa e tortuosa, sem o surgimento de calos e bolhas,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">segura e sem percalços, teremos, obrigatoriamente,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">que fazer uso de sapatos velhos,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">os quais,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">devido à</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">sua</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">flexibilidade e maciez,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">adaptam-se facilmente</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">àquele tipo de</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">jornada.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Se, ao contrário, pretendemos fazer uma caminhada arrojada, exibida,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">cheia de performance e açodada, teremos obrigatóriamente que lançar mão de sapatos novos, brilhantes de solado impecável e com um grande tempo de uso pela frente, pois estes, por sua resistência e beleza, se prestam melhor para tal missão.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Da mesma forma,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">são os pés e os</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">homens. </span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Para</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">duras e tortuosas caminhadas, por terrenos pedregosos e áridos, melhor se adequam a ela os pés calejados e empedernidos, assim como, pés jovens e imaculados,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">melhor se prestam para caminhadas curtas e velozes</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">e sem percalços.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">A mesma estratégia se aplica aos homens. Para tarefas que exigem maturidade e razão, deveremos contar com homens maduros,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">experimentados, dotados da mais ampla sabedoria.</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Do mesmo modo, se os obstáculos a serem vencidos necessitam de arrojo e audácia, devemos, para isto,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">contar com homens jovens e cheios de vitalidade para sua transposição.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Dessa forma, todos, sem exceção, reclamam e merecem ver reconhecido, o seu espaço na caminhada da humanidade. Com o devido cuidado e respeito devemos apenas, na</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">partilha da jornada a trilhar,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">entregar</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">a cada um, a tarefa</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">que possa realizar com excelência.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Se, em determinada quadra do caminho, tivermos que trilhar uma estrada cheia de armadilhas, pedregosa e que necessite de grande experiência no seu percurso, não devemos destinar este trecho a pés macios e não calejados, calçados em sapatos novos e rígidos. Pois, fatalmente, eles não irão concluí-la satisfatoriamente, tamanhos serão os estragos advindos da impropriedade do conjunto - sapatos novos/pés macios.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Ao contrário, se a estrada a ser trilhada requer força, arrojo e ação enérgica para se rápido trilhar, não devemos entregá-la a pés ressequidos e calejados, calçados em sapatos velhos e folgados. Pois, da mesma forma, estes não irão cumprir sua missão a contento, pois já não possuem a higidez, o viço</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">e o fogo da juventude. </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">A necessidade do grande dispêndio de energia, de brilho e rapidez na ação, fatalmente vencerão aqueles velhos pés, calçados em frouxos e velhos sapatos.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Portanto, o que pretendo dizer é que jovens e velhos jamais podem e nem devem prescindir um do outro, agindo cada um no seu</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">território particular e com as</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">aptidões e eficiências</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">que lhes são próprias.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">Pois como as estradas, a vida é cheia de trechos tortuosos e ardilosos aqui, ou repleta de urgentes</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">e impetuosos desafios acolá. No entanto, todos,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">para a conquista</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">objetiva do bem comum,</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">devem</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">unir seus mais caros valores</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">e despender</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">os seus</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">maiores</span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;">esforços.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US"><o:p><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"> </span></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US">Isaac Sandes</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span lang="EN-US">25/11/2009.</span></div>
<!--EndFragment--> </b></div>
GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496723381062482562.post-69875630743392700562009-11-25T02:29:00.002-03:002009-11-26T09:11:00.461-03:00COMENDO UM GALO<!--StartFragment--> <p class="MsoNormal"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span></p> <p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p> <p class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><o:p> <b>Isaac Sandes</b></o:p></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>A estorinha é conhecida de todos:<span style="mso-spacerun: yes"> </span>“O bêbedo ia sendo conduzido sob violenta surra por policiais, quando, passando por uma<span style="mso-spacerun: yes"> </span>caridosa velhinha, esta apelou:<span style="mso-spacerun: yes"> </span>- Pelo amor de Deus, matem logo esse pobre coitado,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>mas não o maltratem tanto -<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Apesar<span style="mso-spacerun: yes"> </span>da violenta surra que ia levando, o bêbedo ainda ouviu a sugestão da velhinha e teve tempo de se defender:<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Não, senhora, por favor.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Do jeito que vai, vai muito bem. “</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Tal<span style="mso-spacerun: yes"> </span>estorinha vem muito a propósito de recentes fatos que vi publicado nos jornais diários.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Em cinematográfica operação que, por sua envergadura, deve ter deixado fronteiras desguarnecidas, matas indefesas e população a mercê da marginalidade, reuniu-se a fina flor da Polícia Rodoviária Federal, do IBAMA e da Policia Civil alagoana, para coibir uma atividade que, com certeza, vinha abalando as estruturas da segurança e bem estar do mundo animal.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Não estou falando de um estouro de Gnus do Serenghetti, ou do assassinato do último casal de ararinha azul, ou ainda, da proteção do último tigre dente de sabre.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Falo da gigantesca operação levada a efeito pelo conjunto de forças acima mencionado, a qual numa espetacular intervenção que contou com armas que faziam os morros cariocas tremerem nos sapatos, efetuou<span style="mso-spacerun: yes"> </span>a prisão de cerca de 120 pessoas, entre espectadores e proprietários, e a apreensão de cerca de 320 galos de briga, tudo isso em poeirentas rinhas de ponta de rua.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Mas, alguém há de perguntar: “Onde é que entram o bêbedo e a velhinha nesta estória ? ”.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Explico: Os bêbedos seriam os galos apreendidos e a velhinha seriam os heróicos agentes envolvidos na galinácea operação.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Como assim ???<span style="mso-spacerun: yes"> </span>- Compreenderão quando contextualizar o desenlace da galiforme ação.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Concluída e comemorada com estrondoso sucesso, a operação, ao final, teve inusitado desfecho. <span style="mso-spacerun: yes"> </span>Tal qual a velhinha da estória,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>os operantes agentes,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>ficaram tão sensibilizados com os maus tratos a que estavam sendo submetidos os pobres galos que, lhes impuseram o destino pretendido para o bêbedo; <span style="mso-spacerun: yes"> </span>mataram todos 320 galos e os converteram em alimento de presidiários. Como os pobres galos não podiam falar tal qual os galinhos de estórias em quadrinhos, não tiveram a oportunidade de sugerir aos zelosos agentes públicos que, da forma<span style="mso-spacerun: yes"> </span>como estavam sendo tratados na <span style="mso-spacerun: yes"> </span>rinha,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>estavam indo<span style="mso-spacerun: yes"> </span>muito bem,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>obrigado !!!</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span>Teme-se agora possíveis desdobramentos violentos para esta estorinha.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Após a<span style="mso-spacerun: yes"> </span>compadecida morte dos trezentos e vinte galos gladiadores,<span style="mso-spacerun: yes"> </span>e da sua conversão em alimento de presidiários, descobriu-se que todos<span style="mso-spacerun: yes"> </span>eram alimentados com hormônios virilizantes para que desenvolvessem agressividade e espírito de luta incomuns.<span style="mso-spacerun: yes"> </span>Assim, estão as autoridades vigilantes para que nas próximas rebeliões nos presídios não surjam presos brigando com esporões e bicos de tenazes.</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify">Isaac Sandes</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify">25/11/2009</p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-spacerun: yes"> </span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align:justify"><span style="mso-tab-count:1"> </span><span style="mso-tab-count:1"> </span></p> <!--EndFragment-->GEORGE SARMENTOhttp://www.blogger.com/profile/15943133317633366632noreply@blogger.com2