GEORGE SARMENTO
Semana passada, um grupo de colegas do Ministério Público conversava animadamente sobre a polêmica promoção por merecimento para o cargo de procurador de justiça, ainda sem data para chegar ao fim. Em dado momento, um dos interlocutores, com mais de 30 anos de casa e já avançado na idade, pede a palavra e afirma com a arrogância dos parvos:
- Esse pessoal que tem mestrado, doutorado e especialização pensa que é melhor que os outros. Eu mesmo só votaria em quem dá duro no trabalho, que veste a camisa da instituição. Jamais nessa gente que só pensa em dar aulas nas faculdades.
Embora eu seja um habitué dos bate-papos nos cafezinhos, não estava presente para responder na lata a essa pérola da intolerância provinciana.
Não é a primeira vez que tais assertivas chegam aos meus ouvidos pela boca de testemunhas indignadas com tamanha arrogância. Confesso que não tenho raiva dessas manifestações de raquitismo intelectual. Sei que é produto de mentes esclerosadas e corroídas pelas traças do atraso. Discutir com tais indivíduos é dar-lhes um valor que não possuem. É transformar simples grãos de areia em pedras preciosas. Além do mais, como dizia Oscar Wilde, devemos escolher nossos inimigos pela inteligência. E esse, definitivamente, não é o caso.
O curioso é que o preconceito é dirigido a uma das categorias mais injustiçadas do país: os professores. Justamente àqueles que ganham menos, sofrem com as péssimas condições de trabalho e são vítimas do desaparelhamento da educação no Brasil. Sejamos francos. As dezenas de colegas que exercem o magistério o fazem por vocação e não com o objetivo de auferir lucros, já que o salário de docente é insignificante em relação aos subsídios de promotor ou procurador de justiça. A Constituição Federal assegura o direito de ensinar em instituições de ensino superior, sem que isso configure acumulação ilícita de cargos. Além disso, a atuação na sala de aula é uma das estratégias mais eficientes para estimular vocações e atrair jovens talentosos para a carreira no Ministério Público.
Em 24 anos na instituição, jamais testemunhei um caso sequer de negligência ou desídia em razão de atividades no magistério. Ao contrário, os colegas professores são também profissionais exemplares. Ninguém é obrigado a ensinar em faculdades, fazer pós-graduação ou escrever artigos científicos. Conheço excelentes promotores de justiça que decidiram não trilhar esse caminho e são reconhecidos pela sociedade civil pelo excelente trabalho que desempenham. Mas é justo que os pós-graduados sejam execrados por terem estudado? Serão eles promotores de segunda categoria? Claro que não. Trata-se de discriminação tosca que deve ser rechaçada com veemência.
Recentemente fui convidado pelo Diretor da Escola Superior do Ministério Público, Dr. Sérgio Jucá, para proferir uma palestra sobre questões polêmicas do mandado de segurança. Contava-se nos dedos das mãos o número de promotores de justiça presentes. Pensei cá com os meus botões: é o conferencista que não presta? O tema é desinteressante? A divulgação foi insuficiente? Aí lembrei que acontecia a mesma coisa em outros eventos. Quase sempre foi preciso convocar servidores e estudantes de Direito para garantir o quorum necessário à realização dos seminários.
Por que isso acontece? Simples. A participação em cursos organizados pela ESMPAL jamais foi parâmetro de avaliação de desempenho nas promoções por merecimento. Na magistratura estadual e federal, a aprovação em cursos oficiais, inclusive os promovidos pela Escola Nacional de Magistratura é condição sine qua non para a promoção pretendida. Nunca vi um só juiz melindrado por tais exigências. Sem qualificação profissional o magistrado fica estagnado na carreira. E isso ninguém quer. Se a participação nos cursos da ESMPAL ficasse registrada nas nossas fichas funcionais para fins de promoção a situação seria diferente.
A luta de Maurício Pitta tem sensibilizado a classe pela dimensão coletiva que encarna. As manifestações de solidariedade expressam a insatisfação com os critérios adotados atualmente nas promoções por merecimento. Todos estão acompanhando atentamente o desenrolar dos acontecimentos. Tenho certeza que os integrantes do CSMP, eleitos democraticamente pela classe em eleição disputadíssima, saberão apreciar as candidaturas com impessoalidade e equilíbrio, justificando suas escolhas através de votos fundamentados. O Ministério Público só tem a ganhar com isso. Agora é só esperar para ver.
Forte abraço
George Sarmento
- Esse pessoal que tem mestrado, doutorado e especialização pensa que é melhor que os outros. Eu mesmo só votaria em quem dá duro no trabalho, que veste a camisa da instituição. Jamais nessa gente que só pensa em dar aulas nas faculdades.
Embora eu seja um habitué dos bate-papos nos cafezinhos, não estava presente para responder na lata a essa pérola da intolerância provinciana.
Não é a primeira vez que tais assertivas chegam aos meus ouvidos pela boca de testemunhas indignadas com tamanha arrogância. Confesso que não tenho raiva dessas manifestações de raquitismo intelectual. Sei que é produto de mentes esclerosadas e corroídas pelas traças do atraso. Discutir com tais indivíduos é dar-lhes um valor que não possuem. É transformar simples grãos de areia em pedras preciosas. Além do mais, como dizia Oscar Wilde, devemos escolher nossos inimigos pela inteligência. E esse, definitivamente, não é o caso.
O curioso é que o preconceito é dirigido a uma das categorias mais injustiçadas do país: os professores. Justamente àqueles que ganham menos, sofrem com as péssimas condições de trabalho e são vítimas do desaparelhamento da educação no Brasil. Sejamos francos. As dezenas de colegas que exercem o magistério o fazem por vocação e não com o objetivo de auferir lucros, já que o salário de docente é insignificante em relação aos subsídios de promotor ou procurador de justiça. A Constituição Federal assegura o direito de ensinar em instituições de ensino superior, sem que isso configure acumulação ilícita de cargos. Além disso, a atuação na sala de aula é uma das estratégias mais eficientes para estimular vocações e atrair jovens talentosos para a carreira no Ministério Público.
Em 24 anos na instituição, jamais testemunhei um caso sequer de negligência ou desídia em razão de atividades no magistério. Ao contrário, os colegas professores são também profissionais exemplares. Ninguém é obrigado a ensinar em faculdades, fazer pós-graduação ou escrever artigos científicos. Conheço excelentes promotores de justiça que decidiram não trilhar esse caminho e são reconhecidos pela sociedade civil pelo excelente trabalho que desempenham. Mas é justo que os pós-graduados sejam execrados por terem estudado? Serão eles promotores de segunda categoria? Claro que não. Trata-se de discriminação tosca que deve ser rechaçada com veemência.
Recentemente fui convidado pelo Diretor da Escola Superior do Ministério Público, Dr. Sérgio Jucá, para proferir uma palestra sobre questões polêmicas do mandado de segurança. Contava-se nos dedos das mãos o número de promotores de justiça presentes. Pensei cá com os meus botões: é o conferencista que não presta? O tema é desinteressante? A divulgação foi insuficiente? Aí lembrei que acontecia a mesma coisa em outros eventos. Quase sempre foi preciso convocar servidores e estudantes de Direito para garantir o quorum necessário à realização dos seminários.
Por que isso acontece? Simples. A participação em cursos organizados pela ESMPAL jamais foi parâmetro de avaliação de desempenho nas promoções por merecimento. Na magistratura estadual e federal, a aprovação em cursos oficiais, inclusive os promovidos pela Escola Nacional de Magistratura é condição sine qua non para a promoção pretendida. Nunca vi um só juiz melindrado por tais exigências. Sem qualificação profissional o magistrado fica estagnado na carreira. E isso ninguém quer. Se a participação nos cursos da ESMPAL ficasse registrada nas nossas fichas funcionais para fins de promoção a situação seria diferente.
A luta de Maurício Pitta tem sensibilizado a classe pela dimensão coletiva que encarna. As manifestações de solidariedade expressam a insatisfação com os critérios adotados atualmente nas promoções por merecimento. Todos estão acompanhando atentamente o desenrolar dos acontecimentos. Tenho certeza que os integrantes do CSMP, eleitos democraticamente pela classe em eleição disputadíssima, saberão apreciar as candidaturas com impessoalidade e equilíbrio, justificando suas escolhas através de votos fundamentados. O Ministério Público só tem a ganhar com isso. Agora é só esperar para ver.
Forte abraço
George Sarmento
George,
ResponderExcluirParabéns pela reflexão que, a partir do caso do MP, serve para analisar o papel da formação contínua em todas as carreiras jurídicas.
Perceber esses limites na própria carreira é um verdadeiro exercício de honestidade intelectual e pressuposto para que as mudanças se tornem possíveis.
Abraço.
O aperfeiçoamento funcional, acadêmico e pessoal deve ser questão estratégica, tanto das instituições quanto dos seus integrantes. Estudar, sempre! Nem todos têm vocação para ensinar, bem sei disso, mas a carreira de aluno nunca deve ter fim!
ResponderExcluirUm grande abraço.
Mentes estreitas, amigo. É disso que se trata. Com gente medíocre não dá para argumentar mesmo! MAs siga seu caminho pautado pela excelência. Ainda é mais proveitoso.
ResponderExcluirAbraços.