ISAAC SANDES
Aos domingos, sempre me entrego ao prazer de não assistir o “Fantástico”. Prazer que comecei a descobrir quando notei que tal programa era para a grande maioria, a “ Patriótica Neosaldina ”, enquanto, para mim, era a enxaqueca da segunda feira.
Portanto, não mais assisto o “Fantástico”. Entretanto, em um dos últimos domingos, enquanto lia meus e-mails, minha orelha e meu olho que estavam voltados para a televisão, foram covardemente invadidos por aquela musiquinha e a fatal chamada: “ O papel do palavrão na cura dos machucados”, ou algo assim.
Coincidência ou não, antes já havia submetido, aquele até então não global tema, a elevada consideração de meus amigos no almoço das sextas. Disse-lhes que sempre achei que o palavrão tinha o condão de aliviar dores, de desafogar mágoas, de ser o nosso barato e ordinário psicólogo sempre à mão, ou melhor, sempre à boca.
Os politicamente corretos, até no relaxado almoço das sextas, rosnaram contra. Por outra, aqueles que nos ditos almoços, relaxam até os esfíncteres, de pronto concordaram com a inusitada tese curativa. As duas correntes, politicamente corretos de um lado e incorrigíveis relaxados do outro, já davam, a qualquer isento observador, uma antevisão do escore . Mas, como sabemos, nos almoços das sextas não existem isentos. Todos à mesa, numa sexta-feira, assumem suas paixões e as defendem, se possível com facadas e garfadas. - Até que a pacificadora comida chegue!
Caso a ser estudado. O incêndio das paixões nos almoços das sextas-feiras. – Tem sua origem num atávico ritual dos bandos que se reuniam em torno da ancestral fogueira ? - Ou no tempero apimentado que a fome vai jogando na inocente discussão ? - Digam vocês !!
Fato é que a comida demorava. Estávamos todos já arrotando fome e tomados da hipoglicêmica tremedeira. A discussão se avolumava. Já havia contendedores com caras encrispadas. Espumas epilépticas formavam balõezinhos no canto da boca de alguns. Outros, já utilizavam os ditos palavrões para, sem sentir, escoar sua ira.
Quando, aproveitando um vácuo respiratório dos cansados e esfomeados Freuds e Jungs, tive a maldade de lançar a herética intervenção.
Gritei...! - “Calma amigos!!! - Para encerrar a discussão e como tema para reflexão, proponho a seguinte questão:
- Imagine cada um de vocês que, estando Sua Santidade o Papa, não digo o atual, mas qualquer Papa, de Pedro ao mais recente, andando pelos santos corredores do Vaticano a mancar com um dos pés enfiado em uma improvisada sandália de pescador, pois o inchaço de um latejante panariço transformou o dedão do seu pé em um pulsante macete de bombo. Até uma corrente de ar faz doer a santa mancada. Quando, de repente, aquele quase invisível degrauzinho à sua frente o faz dar violenta topada no latejante dedão. Respondam: - Sem paixões e sem pudores - Com que palavras Sua Santidade contemplaria tal ocorrência, enquanto, rodando num pé só, segura e ampara a pulsante e dolorida chaga ?
Na hora, eu e minha genitora, recebemos os mais “elogiosos” encômios dos crentes ali presentes. Foram eles dos mais comezinhos e chulos a herege e anticristo. Imagine, colocar sua santidade no meio de tão inusitada e profana cena. Enquanto os outros, não tendo coragem de verbalizar sua defesa diante daqueles esgares assassinos, apenas sorriam marotamente e diziam: Calma amigos. Calma. Não pensem no santo, imaginem o homem, pensem no mortal e falível homem que há nele. O santo é apenas a ênfase da cena.
Quando a situação estava se tornando quase um festim diabólico, soou a corneta da cavalaria. Era a comida chegando. Fui, assim, poupado de, ali mesmo, me converter no próprio almoço, e tornar-me gravura de Staden.
Neste momento, a salvo, aguardo o próximo almoço das sextas para, antes da má conselheira fome, colher os já refletidos votos e as isentas respostas.
Isaac Sandes
28/07/09
Aos domingos, sempre me entrego ao prazer de não assistir o “Fantástico”. Prazer que comecei a descobrir quando notei que tal programa era para a grande maioria, a “ Patriótica Neosaldina ”, enquanto, para mim, era a enxaqueca da segunda feira.
Portanto, não mais assisto o “Fantástico”. Entretanto, em um dos últimos domingos, enquanto lia meus e-mails, minha orelha e meu olho que estavam voltados para a televisão, foram covardemente invadidos por aquela musiquinha e a fatal chamada: “ O papel do palavrão na cura dos machucados”, ou algo assim.
Coincidência ou não, antes já havia submetido, aquele até então não global tema, a elevada consideração de meus amigos no almoço das sextas. Disse-lhes que sempre achei que o palavrão tinha o condão de aliviar dores, de desafogar mágoas, de ser o nosso barato e ordinário psicólogo sempre à mão, ou melhor, sempre à boca.
Os politicamente corretos, até no relaxado almoço das sextas, rosnaram contra. Por outra, aqueles que nos ditos almoços, relaxam até os esfíncteres, de pronto concordaram com a inusitada tese curativa. As duas correntes, politicamente corretos de um lado e incorrigíveis relaxados do outro, já davam, a qualquer isento observador, uma antevisão do escore . Mas, como sabemos, nos almoços das sextas não existem isentos. Todos à mesa, numa sexta-feira, assumem suas paixões e as defendem, se possível com facadas e garfadas. - Até que a pacificadora comida chegue!
Caso a ser estudado. O incêndio das paixões nos almoços das sextas-feiras. – Tem sua origem num atávico ritual dos bandos que se reuniam em torno da ancestral fogueira ? - Ou no tempero apimentado que a fome vai jogando na inocente discussão ? - Digam vocês !!
Fato é que a comida demorava. Estávamos todos já arrotando fome e tomados da hipoglicêmica tremedeira. A discussão se avolumava. Já havia contendedores com caras encrispadas. Espumas epilépticas formavam balõezinhos no canto da boca de alguns. Outros, já utilizavam os ditos palavrões para, sem sentir, escoar sua ira.
Quando, aproveitando um vácuo respiratório dos cansados e esfomeados Freuds e Jungs, tive a maldade de lançar a herética intervenção.
Gritei...! - “Calma amigos!!! - Para encerrar a discussão e como tema para reflexão, proponho a seguinte questão:
- Imagine cada um de vocês que, estando Sua Santidade o Papa, não digo o atual, mas qualquer Papa, de Pedro ao mais recente, andando pelos santos corredores do Vaticano a mancar com um dos pés enfiado em uma improvisada sandália de pescador, pois o inchaço de um latejante panariço transformou o dedão do seu pé em um pulsante macete de bombo. Até uma corrente de ar faz doer a santa mancada. Quando, de repente, aquele quase invisível degrauzinho à sua frente o faz dar violenta topada no latejante dedão. Respondam: - Sem paixões e sem pudores - Com que palavras Sua Santidade contemplaria tal ocorrência, enquanto, rodando num pé só, segura e ampara a pulsante e dolorida chaga ?
Na hora, eu e minha genitora, recebemos os mais “elogiosos” encômios dos crentes ali presentes. Foram eles dos mais comezinhos e chulos a herege e anticristo. Imagine, colocar sua santidade no meio de tão inusitada e profana cena. Enquanto os outros, não tendo coragem de verbalizar sua defesa diante daqueles esgares assassinos, apenas sorriam marotamente e diziam: Calma amigos. Calma. Não pensem no santo, imaginem o homem, pensem no mortal e falível homem que há nele. O santo é apenas a ênfase da cena.
Quando a situação estava se tornando quase um festim diabólico, soou a corneta da cavalaria. Era a comida chegando. Fui, assim, poupado de, ali mesmo, me converter no próprio almoço, e tornar-me gravura de Staden.
Neste momento, a salvo, aguardo o próximo almoço das sextas para, antes da má conselheira fome, colher os já refletidos votos e as isentas respostas.
Isaac Sandes
28/07/09