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quinta-feira, 20 de agosto de 2009

A VAIA


ISAAC SANDES

Caros amigos, tentarei hoje, descrever e dissecar aqui um personagem que não é de carne e osso, não está na galeria dos tipos humanos, não possui, sequer, personalidade juridica, este tipo artificial de personalidade inventada pelos jurisconsultos, que carece do subjetivismo da alma.
Interessante….! - Até agora, não havia me ocorrido que a personalidade jurídica não tem nenhuma personalidade. Ora, se ela é fria, capitulada, descritiva e prevísivel, - como então chamá-la de personalidade? Que psicólogo se ocuparia em analisar uma personalidade juridica? Tudo ali, previsível, numerado em cláusulas, em capítulos. Cadê os conflitos, complexos, indecisões, culpas, remorsos. Nada, nada!!
Certamente, é um desserviço à psicologia e aos longos estudos da personalidade, a criação da artificial personalidade juridica. Vejam como soa falso! - Personalidade Jurídica!! É o afirmar negando. É pura caricatura !
Mas…, já ia me afastando. Nosso personagem já dava sinais de insatisfação e amuado protesto, traços marcantes de sua alma.
Nosso personagem é universal, democrático não conhece estratos humanos ou sociais. É univesal. Em resumo, é biblíco.
Não me xinguem nem se surpreendam se eu lhes disser que este personagem é a vaia.
A vaia. - Sim meus amigos! A urrante, imemorial e troglodita vaia. Acredito que, depois do balançar negativo ou afirmativo de cabeça, surgiu a vaia, para se opor ao aprovador silêncio, para pautar o certo e o errado na conduta humana. A vaia é a multidão balançando a cabeça num gigantesco não.
Em um país como o nosso, ainda portador de boa dose de complexo de lavadeira, a vaia tem servido como verdadeiro tratamento de choque na busca da auto estima.
Vejam nossas seleções de futebol, invariavelmente, quando saem de nosso país vaiadas e achincalhadas, fazem uma brilhante campanha e sempre trazem a redentora taça. Qual foi a sessão coletiva de análise que o possiblitou? Digo sem medo dos esgares dos eruditos. Foi a vaia!! Nossas vaias, despachadas junto com bagagem da delegação.
A vaia está para nossos Macunainas do futebol, como a capa vermelha está para o touro. O efeito é o mesmo, mexe com seus brios e lhes arranca cavernais reações de auto estima.
Disse, lá atrás, que nosso personagem é bíblico e não blasfemei. Provo!
Certamente, Davi só conseguiu desferir a certeira pedrada na testa do gigante Golias, após ter seus brios revolvidos por uma homérica e hebraica vaia.
Não foi só o ressurgimento da cabeleira que fez Sansão derrubar o templo. Foram também, em boa dose, as bárbaras vaias dos Filisteus.
Os gladiadores derrotados eram sacrificados após terem seus brios revolvidos e agitados por estrondosas vaias!!
E, finalmente, a vaia que mudou para sempre a história da humanidade. Aquela que estamos acostumados a ver, com injetados e lacrimejantes olhos, nas encenações e filmes da Paixão de Cristo, aquela que, mais do que a bacia d’água e a toalhinha para enxugar as mãos, estimulou Pilatos a tomar sua infeliz decisão entre Jesus e Barrabás.
Assim, pelo que tem de universal, pois necessita apenas de um troglodita UUUUUUUHHHH…..UUHHHHHH… - Gritado até pelo mais quadrúpede dos homens ! - A vaia, urrada na hora certa, teria sido decisiva para salvar até a Torre de Babel de seu frustrante fim. Pois tivesse sua internacional multidão de incomunicáveis operários e pedreiros, berrado um contínuo e babilônico Uuuuuuhhhh… Uuuuhhhhh…, nos ouvidos de seus engenheiros e mestres, estes certamente teriam seus brios revolvidos e, numa reação de elevada humildade, teriam pedido desculpas a Deus pela imperdoável soberba e ele, com certeza, daria um jeitinho para que terminassem a obra.
Charge extraída de rleite.wordpress.com/2007/07/

terça-feira, 18 de agosto de 2009

ENTREVISTA IMAGINÁRIA COM OSCAR WILDE


GEORGE SARMENTO

Desembarco na Londres vitoriana sob o denso fog que envolve a cidade. As ruas estreitas estão vaporosas, lúgubres e cobertas de neblina. Homens elegantes de fraque e cartola passam indiferentes pelas calçadas com suas bengalas de cabo em madrepérola.
Aquela noite fria era um convite ao mistério e à sedução. Nada melhor do que entrevistar um dos maiores gênios da literatura inglesa: Oscar Wilde. Nosso encontro imaginário estava marcado para um pub perto do Convent Garden, frequentado por notórios dandys, intelectuais atormentados e vedetes do teatro de revista. O assunto não poderia ser outro: o futuro do casamento na sociedade moderna.
O autor de O Retrato de Dorian Gray está sentado numa confortável poltrona de couro, bebe uma dose de gin com água tônica e observa atentamente as comédia humana que se desenrola ao seu redor. É um crítico impiedoso da sociedade londrina do século XIX. Fiz questão de preparar-lhe uma entrevista no modelo ping-pong:
1. Pergunta - O homem pode ser feliz no casamento?
Resposta - As mulheres estragam qualquer caso de amor com o seu desejo de perpetuá-lo eternamente. Que desgraça para o homem, o casamento! Ele o escraviza tanto quanto os cigarros, e custa muito mais. A base lógica do casamento é o recíproco mal-entendido.
2. Pergunta: Os homens sonham em encontrar o verdadeiro amor de suas vidas?
Reposta: Os homens sempre desejam ser o primeiro amor de uma mulher; este é o efeito de sua insensata vaidade. As mulheres têm um instinto mais sutil. Elas desejam ser o último amor de um homem.
3. Pergunta: O que faz a mulher quando sente que o amor do marido começa a esfriar?
Resposta: Quando a mulher percebe que já não é o objeto das atenções do marido, ou se esquece de qualquer elegância, ou ostenta chapéus extremamente elegantes, pagos pelo marido da outra.
4. Pergunta: Para viver um grande amor é preciso ter muito dinheiro para gastar com o objeto do desejo?
Resposta: Só há uma classe social que aprecia o dinheiro mais do que os ricos: os pobres. O pobre não pode pensar em outra coisa. Aí está a tristeza de ser pobre.
5. Pergunta: O que o senhor acha da fidelidade conjugal?
Resposta: A fidelidade é para a vida sentimental o que a coerência é para a vida do espírito: uma pura confissão de incapacidade. Eis o paradoxo: os jovens gostariam de ser fiéis e não podem sê-lo; os velhos gostariam deser infiéis e não conseguem; não há mais nada a dizer.
6. Pergunta: Quer dizer que a infidelidade é algo positivo na vida contemporânea?
Resposta: Os amantes fiéis só conhecem o lado trivial do amor; as tragédias do amor são privilégios dos amantes infiéis.
7. Pergunta: Como você escolhe os seus amigos?
Resposta: Escolho meus amigos pela beleza, os meus conhecidos pela respeitabilidade e meus inimigos pela inteligência. Para mim a beleza é o milagre dos milagres. Somente os seres superficiais não julgam pela aparência. O verdadeiro mistério do mundo é o visível e não o invisível.
8. Pergunta: Você tem medo da velhice?
Resposta: Para recuperarmos a juventude só precisamos repetir as nossas loucuras do passado. E mais: a tragédia da velhice consiste não no fato de sermos velhos, mas sim no fato de ainda nos sentirmos jovens. Nunca digam que esgotaram a vida. Quando um homem diz uma coisa dessas sabemos que foi a vida a esgotá-lo.
9. Pergunta: O que deve fazer um homem virtuoso para livrar-se das tentações femininas?
Resposta: Não há outro jeito de livrar-se de uma tentação a não ser sucumbindo a ela. Se você resistir, a sua alma adoecerá desejando aquelas coisas que lhe foram negadas. Podemos resistir a tudo exceto às tentações.
10. Pergunta: É melhor estar apaixonado ou casado?
Resposta: Deveríamos estar continuamente apaixonados. É por isso que nunca deveríamos nos casar.
11. Pergunta: O senhor costuma perguntar a idade das mulheres?
Resposta: Desconfiem da mulher que confessa sua verdadeira idade. Uma mulher que diz isso, poderá dizer qualquer coisa.
12. Pergunta: O senhor compreende a alma feminina?
Resposta: As mulheres foram feitas para serem amadas, e não para serem compreendidas.
13. Como conviver com a culpa?
Resposta: A vida é curta demais para que possamos carregar nas costas os sofrimentos dos outros. Cada um vive a sua vida e paga o seu preço. O que dói é que devemos pagar muitas vezes até mesmo por um só erro. De fato, pagamos as nossas culpas inúmeras vezes. No seu relacionamento com o homem o destino nunca fecha as contas.
14. O ciúme é um sentimento devastador para as mulheres?
Resposta: As mulheres feias sempre são ciumentas dos maridos; as bonitas, nunca! Não têm tempo para isso. Estão preocupadas demais com o ciúme dos maridos das outras. A dúvida e a desconfiança transformam afeição em paixão, dando origem àquelas lindas tragédias que tornam a vida linda de ser vivida. Houve uma época em que as mulheres percebiam essa verdade e os homens não, e foi então que as mulheres dominaram o mundo.
15. Pergunta: O senhor tem medo de tornar-se obsoleto?
Resposta: O maior perigo de todos é sermos excessivamente modernos. Corremos o risco de ficarmos repetinamente fora de moda.

Nota biográfica: Oscar Wilde nasceu na na cidade de Dublin em 1864. Muito jovem foi morar em Londres, onde despontou como um dos maiores escritores de língua inglesa. Fez grande sucesso como teatrólogo, contista, cronista e romancista. Proferiu conferências nos Estados Unidos sobre o dandismo, movimento estético do qual era o principal representante. Adepto da vida mundana e extravagante, escandalizou os salões londrinos pela postura libertina e irreverente. Sua fama começa a decair a partir do escandaloso romance com Lorde Alfred Douglas, que acabou lhe rendendo condenação a dois anos de trabalhos forçados. Morre em Paris completamente arruinado no ano de 1900. Está enterrado no famoso cemitério Père Lachaise, sendo visitado diariamente por legiões de fãs de todo o mundo.
Bibliografia: As respostas de Oscar Wilde foram extraídas do livro Aforismos. Clássicos Econômicos Newton, Rio de Janeiro, 1995.