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sábado, 5 de setembro de 2009

CHALITA-BERARD: A EXPOSIÇÃO DO ANO





A ALIANÇA FRANCESA DE MACEIÓ apresenta a exposição CHALITA-BERARD, que reunirá as principais obras de dois ícones da pintura: Pierre Chalita e Daniel Berard. São cerca de 40 quadros pintados entre os séculos XIX e XX, reunidos pela primeira vez em Alagoas. A exposição integra as Comemorações do ANO DA FRANÇA e estará aberta para o público entre 23 de setembro a 22 de novembro, na Fundação Chalita, bairro de Jaraguá. A entrada é gratuita. Compartilho com vocês a APRESENTAÇÃO que redigi para o evento.


Durante o Segundo Reinado, D. Pedro II engaja-se no projeto de fortalecimento da identidade nacional, estimulando historiadores, pintores e músicos a retratar o país em toda sua diversidade cultural. Entre iniciativas oficiais, está o Prêmio Viagem, instituído pelo Imperador para financiar o pensionato no exterior de artistas talentosos durante o período de três anos. A idéia era dar continuidade ao trabalho desenvolvido pela Missão Francesa de 1816 na construção do sentimento de brasilidade.
Daniel Bérard foi um dos bolsistas escolhidos para estudar na Europa, ao lado de pintores como Almeida Júnior e Vitor Meireles. Nascido em 1846, o jovem Bérard muda-se para a França em 1873, onde estuda em Avignon, Marseille e Paris. Com a pensão de 300 francos, destaca-se como aluno aplicadíssimo e vocacionado, que participa ativamente de diversas exposições em importantes cidades européias. De volta ao Brasil, envolve-se em vários projetos culturais e exerce o magistério na cátedra de desenho. Em 1896, expõe no Salão Nacional de Belas Artes, obtendo o reconhecimento do público e da crítica especializada. Sua pintura ficou marcada pelo simbolismo alegórico e pela habilidade de retratista.
Pierre Chalita nasceu em 1930 e pinta desde a adolescência. Aos 28 anos de idade muda-se para Paris, onde estuda na Escola Superior de Belas Artes e exerce o ofício de pintor. De volta ao Brasil, assume o cargo de professor de pintura e técnica de composição artística da UFPE e UFAL. Participa da exposição Surrealistas Brasileiros e expõe suas telas em mostras individuais e coletivas no exterior (Madri, Roma, Viena, Barcelona e Paris). Detentor de estilo próprio e inconfundível, Chalita não se filia a nenhum movimento artístico. As referências estéticas e psicológicas que o acompanham buscam captar a condição humana em um mundo cheio de contradições e perplexidades.
CHALITA-BÉRARD é o encontro entre dois grandes artistas que se destacam pela originalidade e simbolismo de suas obras. A exposição reúne os quadros mais representativos, pintados sob a influência de grandes mestres da pintura européia como Henri Lehmann, Gustave Jacques e Chapelain-Mydi. São gerações que se entrecruzam numa mostra histórica e inusitada, coroando as comemorações do Ano da França no Brasil.

GEORGE SARMENTO
Diretor da Aliança Francesa


sexta-feira, 4 de setembro de 2009

A TESTEMUNHA NA HISTÓRIA E NO DIREITO


GEORGE SARMENTO

Acontecerá, no próximo dia 30 de setembro, no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, o lançamento do livro A TESTEMUNHA NA HISTÓRIA E NO DIREITO, de Jayme de Altavila. A primeira edição surgiu em 1967 e é a única obra do gênero publicada no país. A iniciativa da EDUFAL de reeditá-la e incluí-la na importante Coleção Nordestina é uma demonstração de comprometimento com a memória dos grandes autores do passado, que honraram Alagoas com clássicos da História, Sociologia e Direito. Tive a honra de ser escolhido para fazer sua APRESENTAÇÃO, cujo texto quero compartilhar com vocês.


A reconstituição da verdade no processo judicial é um dos temas mais caros ao Direito. Sobre ele se debruçaram os filósofos e juristas mais renomados de todos os tempos. Sua importância é indiscutível, pois o procedimento justo e equitativo pressupõe o esclarecimento de fatos controversos, dos quais dependem a vida, a liberdade e o patrimônio dos envolvidos no litígio. Ainda hoje, com todos os avanços científicos e tecnológicos, a busca da verdade ainda é o maior desafio da jurisdição civil e penal de todos os países democráticos.
Nos sistemas jurídicos contemporâneos, os principais meios de prova são: documental, pericial e testemunhal. A prova testemunhal é a mais problemática e a menos confiável. O magistrado deve ser prudente na análise dos depoimentos produzidos no processo para evitar que a mentira prevaleça sobre a verdade, conspurcando a sua percepção cognitiva dos fatos investigados. Além disso, ele tem de lidar com imprecisões, análises distorcidas, equívocos e, até mesmo, interesses espúrios.
A História do Direito mostra que as civilizações tiveram grande preocupação com a testemunha. Por muitos séculos, este foi o principal meio de prova adotado nos processos judiciais. Manuscritos antigos e obras milenares como a Bíblia e o Código de Hamurabi são a prova de que todos os povos faziam uso desse recurso para buscar a verdade e defender as suas pretensões diante de soberanos, conselhos e tribunais.
A Testemunha na História e no Direito resgata o legado deixado pelo tempo e traça a linha evolutiva da prova nos principais sistemas jurídicos. O texto toma a Antiguidade como ponto de partida para analisar o papel da testemunha no Egito, Mesopotâmia, Israel, Índia, Grécia e Roma. Prossegue com o estudo do direito medieval, destacando a grande contribuição das ordenações portuguesas para o aprimoramento do direito processual. Também situa o tema no Direito Canônico, no Código Napoleônico e no Código de Bustamante. Por fim, disseca o regime de provas testemunhais adotado pela legislação brasileira, apontando os principais avanços e distorções.
Embora tenha sido publicada em 1967, a obra ainda é fonte obrigatória de consulta para todos que pretendam compreender a peregrinação da humanidade em sua luta pela justiça como instrumento de combate ao arbítrio e ao despotismo, ainda tão presentes nas relações intersubjetivas. Com linguagem simples e objetiva, o texto conduz o leitor pelos tortuosos caminhos trilhados pelo direito até a concepção de métodos seguros de avaliação da prova testemunhal no processo.
O autor, Jayme de Altavila, nasceu em 1895 e escreveu Origem dos Direitos dos Povos, um clássico do gênero que é adotado em diversos cursos de Direito no país. Foi um dos fundadores da Faculdade de Direito de Alagoas, hoje integrada à Universidade Federal de Alagoas. Doutor em Direito, ocupou importantes cargos no Ministério Público e na magistratura federal. Teve destacada participação política, exercendo os mandatos de deputado estadual, deputado federal e prefeito de Maceió.
A reedição de A Testemunha na História e no Direito supre importante lacuna na literatura jurídica, assegurando a estudantes, advogados e integrantes de carreiras jurídicas o acesso ao pensamento dos grandes juristas que lutaram corajosamente para que a atividade judiciária se transformasse num vetor de pacificação social e de promoção dos direitos fundamentais.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

BELEZA

ISAAC SANDES

De repente, me assalta a pergunta e penso alto. “Existirá a beleza, em si mesma?” Então o amigo que se encontrava próximo, de peito estofado por helênica sabedoria, enigmático, fazendo cara de erudito do Readers Digest responde: “Depende!”. Este depende tinha o tamanho do Mistério da Aleluia.
E eu, diante de tanta pompa e circunstância, encolho-me amarelado, e ouso fazer a arriscada e conseqüente pergunta: - “Depende do que?” - Após charmoso meneio de cabeça, - Só faltou dizer “Tick”, como indiano de novela - Meu interlocutor responde com uma tirinha de perguntas: “ Amigo, tudo é relativo? É ou não é?” E jogou no ar uma espessa baforada do legítimo Montecristo.
Diante do górdio impasse, fiz cara de Gugu Literato e resolvi abandonar o socorro do erudito amigo e, por conta própria, passei a queimar meus preciosos neurônios na busca da quase impossível resposta.
Ainda reverberando na cabeça, a escapista pergunta do erudito, fui ao Gugu, o inteligente, e lá digitei: - Relatividade – Resultado: 456.000 ocorrências, para relatividade. Tinha, Einstein, velocidade da luz, buraco negro, buraco de minhoca, fenda espacial, E=mc2. Confesso que fiquei um tanto quanto atarantado e fiz recomendações elogiosas à genitora do erudito amigo.
Com medo de entrar em parafuso, aterrissei na secular questão, usando as ferramentas de pensamento a meu alcance. No entanto, não me saía da cabeça a questão: “Tudo é relativo”. Pensei: - Se tudo é relativo, a beleza também o é. Ora, tava ali o desenlace, tão claro, mas tão claro, que não me deixava enxergar. Pois é amigos, a clareza muita vezes nos ofusca. É por isso que o imortal Nelson Rodrigues nos falava do “Óbvio ululante”, e dizia: “Só os gênios conseguem enxergar o óbvio ululante".
Pronto, a beleza é relativa, por isso o sapo morre de amores pela sapa, o urubu acha lindo seu filhote, encontramos casais que acreditamos não pertencer à mesma espécie, pessoas amando outras que parecem ter saído de um experimento genético vanguardista.
No entanto, me assalta uma recaída de dúvida. – Será que não existe um mínimo de padrão de beleza? Diante de um Michelangelo alguém poderia dizer: A beleza é relativa, acho-o um lixo, horrível. Diante de uma Capela Sistina, insistir com tédio: “ Mais ou menos, na calçada da Praça da República existem centenas de pinturas mais belas “. Diante do Out Door da moça da Lancome o outro a dizer: “ Nada de mais, vi muito mais beleza numa Dercy, numa Zezé”.
Garanto a vocês que, estivesse por perto, meu erudito amigo abandonaria sua ensaiada fleugma, esqueceria o “Tudo é relativo” e, com um taco de beisebol, partiria o coco de hereges observadores, numa versão pós moderna de “laranja Mecânica”.
Por falar no erudito amigo, outro dia, andava eu já com pensamentos terrenos e esquecido da Einsteiniana discussão travada lá atrás, quando o encontro. Esbaforido, cabelos assanhado, pose desfeita e em estado de pluvial sudorese. Praticamente me arrastou pela gola e, sem nenhuma introdução, foi dizendo: “Não, não. Não é relativa! não é relativa! Agora eu sei, não é relativa !”. Assombrado e sem me lembrar do esquecido debate, pensei: - “ “Meu Deus, está tendo um surto de esquizofrenia “ – Me recompondo e procurando cuidadosamente interagir com o surtado, perguntei: - O que não é relativa ? O que ?”. E ele: “ A beleza amigo, a beleza, ela existe, é concreta, não há relatividade nela, o belo é belo e o feio é feio, eis a verdade indiscutível e imutável “. Como na piada de Camões, tardiamente me caiu a ficha, lembrei-me de nossa antiga discussão e da sua, então, olímpica posição em favor da relatividade da beleza.
Naquele momento, senti que em vez de um surto de esquizofrenia, meu impostado amigo havia saído do seu surto de erudição e recobrado sua humilde condição humana.
Intrigado, comecei a imaginar em que momento da sua etérea vida ele havia se recuperado de sua síndrome de Zeus. Teria se tornado Hare Krishna, Budista, taoista? Então, me sentindo mais próximo de um humano perguntei-lhe: - “ Amigo, como chegaste a esta segura e definitiva conclusão?”. E ele, ainda ofegante: - “Fazendo Pilates, a beleza faz Pilates!!”. Mais intrigado ainda pergunto: - Pilates...??? Como assim? “. Enfim, recuperando a calma, explica: - “Pois é amigo, descobri que a beleza existe e faz Pilates, ela está personificada em uma das minhas colegas de Pilates. Toda vez que a vejo bato na boca e, baixinho repito: - Nunca mais diga tal asneira. A beleza existe, ela está bem ali em nossa frente, e a boca me repreende. - Desculpe não fui eu, eu só falei, seus olhos é que chegaram a tal conclusão e me mandaram falar, pois não são eles que tudo vêem e tudo julgam? Eu apenas verbalizava o que eles viam ”.
Eu, que um dia fui me socorrer daquela pose de obelisco, a partir dali, nunca mais discuti sobre a certeza ou a relatividade das coisas ou sentimentos, com especial destaque para a beleza, já que tudo é absolutamente relativo em determinado momento e, da mesma forma, é indubitavelmente concreto em outro. Assim; como foi, e é, a pendular certeza do erudito amigo. Tudo depende apenas do estado em que nossa alma se encontra ao ver as coisas, os fatos e as pessoas.

Isaac Sandes27/08/2009